TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
369 acórdão n.º 674/16 atribuição de efeito suspensivo ao recurso da decisão da AdC que aplique uma coima se, reveste de caráter de execução prévia da coima, por violação dos princípios constitucionais do acesso ao direito e à tutela jurisdi- cional efetiva, da proporcionalidade e da presunção da inocência, nos termos do n.º 5 do artigo 20.º, do n.º 2 do artigo 18.º e do n.º 2 do artigo 32.º da CRP. B. A assunção interpretativa do TCRS não encontra a mínima correspondência na letra e/ou no espírito da norma (de acordo com as regras de interpretação consagradas no artigo 9.º do CC), nem com o princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva – cfr. artigo 20.º da CRP. C. A interpretação da norma no sentido da (possível) aceitação nos termos legais da prestação de caução não é inconstitucional porque não retira ao recorrente, por um lado, a possibilidade de acesso aos tribunais e à tute- la jurisdicional efetiva nem, por outro lado, permite a invasão da esfera jurisdicional (ou seja, a violação do princípio da reserva da função jurisdicional) quanto à decisão a adotar (artigos 20.º, 268.º e 202.º da CRP). D. A atribuição de efeitos meramente devolutivo aos recursos não é inconstitucional (n.º 1 do artigo 84.º). E os n. os 4 e 5 do artigo 84.º não fazem depender o direito ou a possibilidade de recurso para os Tribunais da prestação de caução (o que seria inconstitucional) de valor igual à coima ou não e, por razões de insuficiência económica, o visado não pudesse recorrer da decisão da AdC, por violação dos artigos 20.º (e 268.º) da CRP, pelo que também não são inconstitucionais. E. A interpretação ab-rogante do TCRS falece uma vez que se desvia dos objetivos da norma e, principalmente, da ratio do fim da punição das infrações às regras da concorrência, nomeadamente, os deveres de prevenção geral e especial das coimas aplicadas por práticas restritivas da concorrência de natureza contraordenacional. F. A previsão legal dos n. os 4 e 5 do artigo 84.º da Lei n.º 19/2012 foi sopesada com os princípios da adequação, necessidade e proporcionalidade (artigo 2.º da CRP) e, deste modo, em nada colide com os princípios cons- titucionais do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, proporcionalidade e presunção de inocência. G. Igualmente não priva o processo da justeza, adequação e razoabilidade próprias de um processo equitativo, nem denega (privando os eventuais recorrentes) o acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva, nem viola o princípio da presunção da inocência. H. Os n. os 4 e 5 do artigo 84.º consubstanciam o aumento da equidade, celeridade e eficiência em termos de garantias processuais e da adequação dos procedimentos de recurso judicial à incumbência constitucional de defesa da concorrência que cumpre à AdC prosseguir nos termos da lei e dos Estatutos [cfr. alínea f ) do artigo 81.º]. I. E é proporcional face ao objeto e fim das normas e do bem jurídico constitucionalmente consagrado da proteção de valores fundamentais para a estrutura e funcionamento da economia, num mercado livre e concorrencial, em prol da defesa das empresas e do bem-estar dos consumidores, ou seja, a proteção do bem jurídico Concorrência que a punição às infrações às regras da concorrência previstas e sancionadas na Lei n.º 19/2012 a AdC visa acautelar. J. Ademais o TCRS também não acompanha o entendimento reiterado do TC quanto à natureza do direito contraordenacional português porquanto se trata de um processo contraordenacional (de natureza “para- -penal”) que corre termos por uma entidade administrativa no âmbito dos seus poderes sancionatórios e, portanto, não emite no final uma decisão administrativa stricto sensu no âmbito do direito administrativo. K. A interpretação de que a prestação de caução se trata de uma oportunidade de a AdC (e o Estado) fazer uma execução prévia de uma sanção pecuniária à custa das empresas (agentes económicos visados e/ou administra- dores das visadas) valendo-se do seu jus imperium não tem qualquer fundamento legal (na letra ou no espírito da norma). L. O artigo 69.º da Lei n.º 19/2012, entre outros, impõe que se considere a situação económica do visado para determinar o montante concreto da coima a aplicar, portanto, a Lei da Concorrência incorpora o princípio da proporcionalidade na fixação montante concreto da coima (como nas demais situações previstas na referida Lei). M. A interpretação sistemática do artigo 69.º com as normas do Capítulo IX respeitante aos recursos judiciais, todos da Lei n.º 19/2012, permite determinar o meio e o modo adequado para a prestação da caução e, deste modo, assegurar o efeito suspensivo do recurso – cfr. artigo 206.º do CPP ex vi artigo 83.º da Lei n.º 19/2012
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