TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
362 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pretenda obter o efeito suspensivo, e não a definição do regime de execução de uma medida ante- cipatória da sanção administrativamente imposta, sendo a execução da coima consequência prática do regime que impõe a prestação de caução, não constituindo, porém, o seu conteúdo normativo; o arguido continua a presumir-se inocente até se tornar definitiva a decisão judicial relativa à impugna- ção da sanção contra si proferida, pelo menos prima facie . IV – A norma em apreciação não nega o direito do arguido impugnar judicialmente a decisão adminis- trativa contra si proferida, limitando-se a estabelecer como regra o efeito meramente devolutivo ao recurso, impondo determinadas condições para a atribuição do efeito suspensivo; ora, o princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva não impõe a regra do efeito suspensivo ao recurso, nem mesmo quando esteja em causa a impugnação contenciosa de atos administrativos, inserindo-se a solução normativa encontrada, na margem de que o legislador dispõe neste âmbito, desde que respei- tadas as demais exigências constitucionais. V – No âmbito de um procedimento sancionatório, mais do que o direito ao recurso, estritamente com- preendido, firma-se um efetivo direito de ação por parte do arguido contra um ato da administra- ção pública, pressupondo, o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado constitucionalmente, a garantia da via judiciária, que se concretiza, numa das suas dimensões, no direito de acesso, sem constrangimentos substanciais, ao órgão jurisdicional para ver dirimido um litígio. VI – A norma sub iudicio estabelece que só pode ser atribuído efeito suspensivo à impugnação de decisões que apliquem coima quando a sua execução cause “prejuízo considerável” ao visado e este preste caução, reportando-se o ónus imposto ao recorrente tão-somente ao efeito do recurso, embora con- dicionando o efeito útil imediato da impugnação a um ónus que, afinal, se concretiza no cumpri- mento de uma prestação que equivale ao cumprimento da coima; daqui resulta que, de facto, antes de contestar judicialmente a sanção aplicada, o sancionado é, na prática, obrigado a cumpri-la, pelo que a norma sindicada cria, na verdade, um obstáculo ao efetivo direito de tutela contra atos lesivos da administração pública que, por incidir sobre os efeitos da impugnação de uma medida sancionatória, se reflete negativamente na presunção de inocência garantida ao arguido. VII – Um tal regime implica, portanto, uma restrição do acesso à via judicial; na verdade, a garantia de uma via judiciária de tutela efetiva implica não apenas que a impugnação judicial garanta ao arguido a possibilidade de ver reapreciados todos os fundamentos da decisão impugnada, mas também a pos- sibilidade de evitar os seus efeitos, restando verificar se esta restrição do artigo 20.º da Constituição é constitucionalmente admissível face aos três subprincípios em que se desdobra o princípio da pro- porcionalidade: idoneidade (ou adequação), necessidade (ou indispensabilidade) e justa medida (ou proporcionalidade em sentido estrito). VIII– O fim da norma objeto do processo, impondo como regra geral o efeito meramente devolutivo do recurso, condicionando o efeito suspensivo à prestação de caução e à verificação de prejuízo conside- rável, é a diminuição dos recursos judiciais infundados e cujo objetivo seja meramente dilatório, isto é, adiar o pagamento da coima; ora, tomando o propósito expressamente enunciado pelo legislador ao reformular o regime da concorrência, a solução normativa em análise não oferece nenhum pro- blema de desadequação, não se duvidando que a sujeição da suspensão da execução da coima visada
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