TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

317 acórdão n.º 624/16 ou a outros órgãos da Administração, mas também a terceiras pessoas, a particulares ou adminis- trados que se encontrem em face dela numa relação geral de poder; têm, como é uso dizer, eficácia jurídica bilateral. Esses particulares são definidos por características genéricas e encontram-se, como acabámos de dizer, por outras palavras, em relação à entidade de que os regulamentos dimanam, numa relação de subordinação geral. (…) Os segundos, por seu turno, têm uma eficácia jurídica unilateral, uma eficácia que se esgota no âmbito da própria Administração dirigindo-se exclusiva- mente para o interior da organização administrativa, sem repercussão direta nas relações entre esta e os particulares. Falta-lhes, portanto, rigorosamente, alteralidade” [em “Teoria dos Regulamentos” in: Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano XXVII, n. os 1-2-3-4, pp. 05 e segs.] [vide, tam- bém, Diogo Freitas do Amaral in: Curso de Direito Administrativo”, 2.ª edição (2012), vol. II, pp. 189/192; Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos in: “Direito Administrativo Geral”, Tomo III, p. 247; J. C. Vieira e Andrade in: “Lições de Direito Administrativo”, 2.ª edição, Coim- bra 2011, p. 117; Mário Aroso de Almeida in: “Teoria Geral do Direito Administrativo: Temas nucleares”, pp. 85/86]. XXVI. E do ponto de vista da relação do mesmo Regulamento de Inspeções face à lei tratar-se-á dum regula- mento complementar ou de execução já que veio desenvolver ou aprofundar a disciplina jurídica inserta no «EMP», nos seus artigos 27.º, als. a) , c) e g) , 34.º, 35.º, 109.º a 113.º, completando-o, densificando- -o, viabilizando-o na sua aplicação concreta e prática aos processos inspetivos e aos atos classificativos ou de notação dos magistrados do M.ºP.º, na certeza de que será ilegal se e na medida em colidir com aquele Estatuto. XXVII. Presentes as qualificações enunciadas quanto ao referido Regulamento temos que entre os limites do poder regulamentar figura a lei [princípio da legalidade] já que o regulamento não pode contrariar um ato legislativo, visto este deter absoluta prioridade sobre aquele [princípio da prevalência ou preferência de lei], para além de tal princípio da legalidade se manifestar neste âmbito numa outra vertente, a do princípio da reserva de lei, princípio esse que implica que o poder regulamentar não se pode desenvolver nas áreas constitucionalmente reservadas à lei [princípio da reserva material da lei] e que o seu exercício tem de ser precedido de lei habilitante, na medida em que não existe poder regulamentar sem funda- mento jurídico numa específica lei anterior [precedência de lei].  XXVIII. Tal implica, de harmonia com o preceituado no n.º 7 do artigo 112.º da CRP, que todos os regu- lamentos, mesmo os independentes, “devem mencionar as concretas leis que os habilitam”, [cfr., entre outros, os Acs. Tribunal Constitucional n. os 268/88, 371/94, 375/94, 110/95, todos in: « www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ »], sendo que a preterição do dever de citação da lei de habilitação equivale à ausência dum elemento formal constitucionalmente imposto como necessário, o que conduz a que tais regulamentos padeçam de inconstitucionalidade formal [cfr., entre outros, os Acs. Tribunal Constitucional n. os 209/87, 75/88, 268/88, 371/94, 375/94, 110/95, 148/00, 501/00, 502/00, 28/01, 117/06, todos consultáveis no mesmo endereço; J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in: “Constituição da República Portuguesa Anotada”, 4.ª edição revista, vol. II, p. 77; Diogo Freitas do Amaral, in: ob. cit. , p. 211]. XXIX. O princípio que se consagra no referido preceito estabelece a precedência da lei relativamente a toda a atividade regulamentar e o dever de citação da lei habilitante por parte de todos os regulamentos, sendo que esta dupla exigência, como assinalam J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, “torna ilegítimos não só os regulamentos carecidos de habilitação legal, mas também os regulamentos que, embora com provável fundamento legal, não individualizam expressamente este fundamento”, já que “essa deficiência traduz- -se na ausência de um elemento formal constitucionalmente necessário” e isso é assim “mesmo quando seja possível identificar a lei habilitante, pois a função da exigência da identificação expressa consiste não apenas em disciplinar o uso do poder regulamentar (obrigando o Governo e a Administração a contro- larem, em cada caso, a habilitação legal de cada regulamento), mas também em garantir a segurança e

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