TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

289 acórdão n.º 611/16  4.ª) A “violação do princípio da proporcionalidade decorrente do artigo 2.º da Constituição” ali ditada, e que agora se sufraga, procede nomeadamente da “(…) medida, ao implicar a ablação total da pensão, ultrapassa[r] a natureza estritamente pecuniária de uma pena disciplinar e ating[ir] as condições de subsistência do agente, que fica privado, por período prolongado de tempo, da prestação que deveria substituir, por efeito da passagem à aposentação, os rendimentos da atividade profissional. Desse modo, a ablação ocorre não já no quadro da relação de serviço, mas no âmbito da relação jurídica de segurança social, que assenta num princípio de contributivi- dade e que tem pressuposta a direta correlação entre o direito às prestações e a obrigação de contribuir (acórdão n.º 188/2009)” e “Além disso, uma medida predeterminada em relação ao montante da pensão declarada perdida e ao tempo de duração da perda do direito, sem qualquer ponderação do efeito que poderá produzir nas condi- ções básicas de vida do arguido, põe em causa o princípio da proporcionalidade, na vertente da necessidade ou exigibilidade, porquanto uma solução legislativa que preservasse um rendimento mínimo destinado a garantir a existência condigna, ainda que prevendo o correspondente alargamento da duração da pena por forma a alcançar a mesma intensidade de sacrifício patrimonial, poderia atingir, com o mesmo grau de eficácia, os fins de retribuição e prevenção geral sem pôr em risco o direito à subsistência.”. 5.ª) Acresce que a medida disciplinar em apreço tem como pressuposto legal de aplicação a existência de uma situação jurídica de aposentação do funcionário ou agente à mesma sujeito (art. 16.º, n.º 1, corpo, do RDPSP), nos termos da qual o funcionário ou agente em causa, por força da sua pregressa contribuição para o sistema de proteção social na situação de actividade no serviço, é titular de um direito à prestação da pensão de aposentação.  6.ª) O qual é um direito subjetivo público (patrimonial, de crédito) constitucionalmente garantido, em sede do âmbito de proteção do “direito à segurança social”, visando aqui proteger o cidadão na doença, velhice ou inva- lidez, por virtude da perda da natural capacidade de trabalho (Constituição, artigo 63.º, n. os 1, 3 e 4). 7.ª) Assim sendo, a norma jurídica constante do artigo 26.º, n.º 1, alínea b) é de qualificar como “lei restritiva” de um direito análogo a um “direito, liberdade e garantia”, no sentido constitucional dos termos (arts. 17.º e 18.º, n. os 2 e 3). 8.ª) Ora, por uma parte, a ablação total da pensão, por um período de três anos, como sucede no caso em apreço excede, manifestamente, o necessário para salvaguardar os fins de prevenção geral negativa (dissuasão) e positiva (reforço da vigência da norma) que esta medida disciplinar visará prosseguir (Constituição, artigo 18.º, n.º 2), sendo certo que haverá uma “alternativa menos restritiva” e igualmente eficaz para a prossecução de tais fins, sem comprometer o direito natural do visado à subsistência: “uma solução legislativa que preservasse um ren- dimento mínimo destinado a garantir a existência condigna, ainda que prevendo o correspondente alargamento da duração da pena por forma a alcançar a mesma intensidade de sacrifício patrimonial, poderia atingir, com o mesmo grau de eficácia, os fins de retribuição e prevenção geral sem pôr em risco o direito à subsistência” (acórdão n.º 858/2014, cit.). 9.ª) Por outra parte, a privação total da pensão, por um período de três anos, materializa a ablação irreversível, nesse lapso de tempo, existencialmente assaz protraído, sobretudo atenta a tendencial limitação da capacidade natural do aposentado para angariar meios de subsistência, trabalhando, do conteúdo essencial do “direito fun- damental à segurança social”, que é análogo a um “direito, liberdade e garantia ( Constituição , artigo 18.º, n.º 3, parte final). 10.ª) Concluímos, em suma, sufragando os fundamentos e o sentido do acórdão n.º 858/2014, cit., que a norma jurídica constante do artigo 26.º, n.º 1, alínea b) , do RDPSP, é materialmente inconstitucional, por vio- lação do princípio da proporcionalidade, decorrente da cláusula do “Estado de direito democrático” e do regime constitucional limitativo da “lei restritiva” ( Constituição, artigos 2.º, 18.º, n. os 2 e 3, parte final, e 277.º, n.º 1)». O recorrido, notificado para o efeito, não contra-alegou. Cumpre apreciar e decidir.

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