TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

28 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como em muitos outros casos similares em que se prevê uma injunção de cumprimento do dever omi- tido – vide, por exemplo, o artigo 403.º, n. os 2 e 3, do Código dos Valores Mobiliários, o artigo 48.º, n.º 2, da Lei n.º 25/2008, de 5 de junho (combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo) ou o artigo 8.º, n. os 2 e 3, da Lei n.º 99/2009, de 4 de setembro (regime quadro das contraordenações do sector das comunicações) –, «trata-se de garantir eficácia ao sistema sancionatório para “evitar que o arguido optasse pelo pagamento da coima desonerando-se do cumprimento do dever” [omitido] (Costa Pinto, 2000 a, 24 e 25)» (assim, vide Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contraordenaçõe s, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2011, artigo 1.º, p. 18, p. 32), reforçando, desse modo, as finalidades preventivas negativas ou de dissuasão, quer em relação à generalidade das pessoas, quer relativamente ao próprio infrator. Por outro lado, e como o Tribunal decidiu no seu Acórdão n.º 29/07, a propósito do artigo 9.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (que estatui: «[o] cumprimento da sanção aplicada não exonera do pagamento da prestação tributária devida e acréscimos legais») – mas com normas paralelas, ainda que não dirigidas exclusivamente a obrigações pecuniárias, no âmbito da Lei-Quadro das Contraordenações Ambien- tais (artigo 24.º) ou do Regime Jurídico da Concorrência (artigo 68.º, n.º 2) –, o cumprimento do dever omitido, por um lado, e as sanções (principais e acessórias) aplicadas em razão do incumprimento, por outro, constituem realidades distintas, não existindo «qualquer obrigação constitucional de dispensar o agente do pagamento da dívida tributária em relação com a qual se verificou a infração, apenas pelo facto de ele ter sido condenado pela prática desta». 11. Só com o Regime Geral das Contraordenações Laborais aprovado pela Lei n.º 116/99, de 4 de agosto, é que as contraordenações consubstanciadas na violação da legislação do trabalho passaram a corres- ponder conceptualmente – tal como sucede hoje, de acordo com o previsto no artigo 548.º do Código do Trabalho – à violação de normas que consagrem direitos dos trabalhadores. A inovação – que simultanea- mente especifica esta espécie de contraordenações por referência ao conceito do artigo 1.º do regime geral consignado no Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro – foi tanto mais relevante, quanto correspondeu a uma evolução clara do legislador de 1999, por comparação com o de 1985 – nomeadamente o do Decreto- -Lei n.º 491/85, de 26 de novembro –, no sentido de reforçar o papel da Administração quer na tutela da posição do trabalhador, quer no que se refere à garantia da concorrência. Relativamente ao primeiro interesse, enquanto o legislador das contraordenações laborais de 1985 con- sagrava como contraordenações apenas as condutas que estabeleciam «meros deveres para com a Administra- ção», não contemplando, por isso, «as disposições que consagram direitos fundamentais como o direito ao trabalho, ao salário ou à liberdade sindical» (cfr. o preâmbulo do referido Decreto-Lei n.º 491/85), a partir de 1999, «a violação, ou perigo sério de violação, de direitos fundamentais dos trabalhadores, tais como a igual- dade e a não discriminação no trabalho e no emprego, a segurança no emprego, a liberdade sindical, o direito ao salário mínimo nacional», entre outros, foi erigido como «critério de qualificação das contraordenações muito graves» (cfr. a intervenção do Ministro do Trabalho e da Solidariedade, Ferro Rodrigues, durante o debate na generalidade das propostas de lei que estiveram na origem da legislação de 1999 in Diário da Assembleia da República , I série, n.º 75, de 23 de abril de 1999, p. 2723, e, no mesmo sentido, a intervenção do Deputado do PSD, Francisco José Rodrigues, ibidem , p. 2736; vide, de resto, a polémica suscitada por tal opção, em detrimento da tutela penal: ibidem , p. 2727, a intervenção do Deputado do PCP, Alexandrino Saldanha). Numa síntese: «[S]e estes diplomas forem aprovados, este é um grande salto em frente, em matéria de regulação das relações de trabalho em Portugal, para caminharmos para uma sociedade em que haja, ao mesmo tempo, não só competiti- vidade mas também uma muito maior coesão social e um muito maior respeito pela dignidade de quem trabalha» (cfr. a mencionada intervenção do Ministro do Trabalho e da Solidariedade in Diário da Assembleia da República , cit., p. 2726)

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