TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

274 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (6) A cobrança rápida e eficaz de dívidas pendentes juridicamente não controvertidas é de importância capital para os operadores económicos na União Europeia, dado que os atrasos de pagamento representam uma das prin- cipais causas de falência que ameaçam a sobrevivência das empresas, em especial das pequenas e médias empresas, e provocam a perda de inúmeros postos de trabalho. (7) Embora todos os Estados-Membros tentem resolver o problema das cobranças em massa de créditos não contestados, tendo a maioria adotado um procedimento simplificado de injunção de pagamento, o conteúdo da legislação nacional e os resultados dos procedimentos internos variam consideravelmente. Além disso, os procedi- mentos atualmente existentes são com frequência inadmissíveis ou impraticáveis em casos transfronteiriços. […]”. Vale o exposto por dizer que a criação de um regime processual especial, diferenciado e simplificado para cobrança de obrigações pecuniárias emergentes de contrato não é, em si, arbitrária ou injustificada, dando resposta a interesses relevantes atinentes ao bom funcionamento do comércio jurídico, com o que este implica para o regular funcionamento dos mercados nacional e europeu. Resta, pois, saber se, no contexto da simplificação processual, a supressão dos incidentes de intervenção de terceiros, com a qual não se conforma o recorrente, implica violação de alguma norma ou princípio da Constituição da República Portuguesa, designadamente no confronto com o seu artigo 20.º. 2.4.2. O recorrente não concretiza, como vimos, qual a dimensão do artigo 20.º da Constituição que resultaria afetada pela interpretação normativa que suprimiu a possibilidade de recorrer ao incidente de intervenção de terceiros neste específico quadro processual. De todo o modo, é evidente que não foi posto em causa o direito de ação, em si mesmo considerado, já que as pretensões em jogo chegaram efetivamente à apreciação de um órgão jurisdicional. Por outro lado, não foi afetado o direito de defesa do requerido, ora recorrente. Isto porque, no con- fronto com a pretensão deduzida pelo requerente, aquele teve oportunidade de deduzir oposição, expondo as razões de facto e de direito pelas quais, no seu entender, tal pretensão não devia ser acolhida, no todo ou em parte, e indicando provas. A circunstância de não ver admitida a intervenção provocada de um terceiro contra o qual (eventualmente) poderia ter um direito de regresso em nada afeta aquele direito de defesa, pois mantêm-se as faculdades descritas e a defesa do requerido no âmbito da relação jurídica estabelecida com o requerente não se confunde com o direito a acionar o terceiro, eventualmente devedor no âmbito de uma (outra) relação jurídica de regresso. O direito de regresso do requerido, a existir, também não é suprimido. Recorde-se que, até mesmo numa normal ação declarativa comum, o único interesse que veria acautelado – desta feita por via de uma intervenção acessória – seria o de estender o caso julgado formado na ação primitiva ao terceiro chamado (v. o artigo 323.º, n.º 4, do CPC), o que, na subsequente ação de regresso, o dispensaria da prova de certos fac- tos e do respetivo enquadramento jurídico. Todavia, o exercício do direito de regresso, não sendo consensual, continuaria a depender de uma ação de regresso subsequente (item 2.3., supra) . Assim se compreende que, com a interpretação em causa, não foi posto em causa o exercício do direito de regresso (o qual, insiste-se, não se confunde com o direito de defesa perante o requerente). Apenas se deslocou toda a discussão atinente ao direito de regresso para a subsequente ação respetiva, em lugar de adiantar uma parte dessa discussão, desde logo, na ação primitiva. Ora, se assim é – ou seja, se o direito de regresso, a existir, não foi posto em causa e tudo se resume ao momento em que a sua discussão pode ter lugar –, impõe-se concluir que tal conformação do processo se inscreve na larga margem de liberdade do legislador para moldar a tramitação processual à natureza das pre- tensões deduzidas, designadamente aquelas que supra se delinearam. Conclusão diferente limitaria excessiva e incompreensivelmente o legislador, impondo-lhe uma solução que, sacrificando a celeridade do processo,

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