TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
273 acórdão n.º 609/16 previstos nos artigos 633.º e seguintes do Código de Processo Civil (cfr. a nova redação do artigo 7.º deste diploma, introduzida pelo artigo 17.º da Lei n.º 374, de 21 de novembro de 1991). Nestas reformas, como na reforma portuguesa, pretende-se facilitar as cobranças e diminuir, na medida do possível, a intervenção do juiz togado para conhecer de causas em que, frequentemente, o devedor não tem funda- mentos válidos de defesa, visando apenas pagar o mais tarde possível. 9. Bastará dizer que, em estudo recente sobre Os Tribunais na Sociedade Portuguesa, elaborado por Boaven- tura Sousa Santos, Maria Manuel Leitão Marques, Pedro Lopes Ferreira e João Pedroso, do Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia de Coimbra, – estudo em que se fez um levantamento rigoroso da litigação nos tribunais judiciais portugueses ao longo dos últimos anos – se apurou que, em 1992, 62% das ações decla- rativas findas foram ações de dívidas, sendo o elemento ‘peso relativo’ das ações de dívida ‘uma constante na litigação cível e uma sua característica estrutural. Este peso tem-se vindo a acentuar ao longo da segunda metade do século XX por efeito de fatores exógenos (transformações económicas) e de fatores endógenos (alterações legislativas ou processuais): em 1942 as ações de dívida representaram 38,5% das ações declarativas cíveis e em 1992 representavam, como referimos, 62%” ( Os Tribunais na Sociedade Portuguesa , apresentação pública em 20 de fevereiro de 1995 dos principais resultados do projeto de investigação sobre a administração da justiça em Portugal, p. 14). Ainda segundo os resultados referidos neste estudo, em 1992 61,6% do total das ações decla- rativas findas tinham valor igual ou inferior a 250.000$00. Por causa desta realidade, refere-se nesse estudo que o ‘baixo valor das ações, combinado com o facto de estas corresponderem basicamente a um só tipo de litígio (cobrança de dívidas), é um poderoso fator de rotinização e de trivialização da justiça portuguesa, colocando- -a ao serviço da conflitualidade económica de pequena dimensão’ ( Os Tribunais cit., p. 17). Importará, ainda, notar que cerca de três quartos das ações declarativas findas em 1992 terminaram antes do julgamento, o que aponta para uma predominância da litigação ‘de baixa intensidade’, a que acresce a circunstância de os titulares de interesses cuja tutela judicial é prosseguida nessas ações declarativas serem’, por regra e não por exceção, enti- dades coletivas, basicamente as sociedades comerciais” (bastará pensar nas instituições de crédito e seguradoras, a par das instituições hospitalares públicas). […]”. Nas últimas duas décadas, a relevância dos regimes processuais tendentes à cobrança de obrigações pecuniárias emergentes de contrato até certo montante revelou-se não apenas pela multiplicação de regimes nacionais a tal destinados, mas também através da aprovação, no plano da União, do Regulamento (CE) n.º 1896/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, que cria um procedi- mento europeu de injunção de pagamento ( Jornal Oficial 399, de 30 de dezembro de 2016, p. 1), alterado pelos Regulamentos UE n. os 936/2012 e 517/2013, em cujos considerandos se pode ler o seguinte: “[…] (3) O Conselho Europeu de Tampere de 15 e 16 de outubro de 1999 convidou o Conselho e a Comissão a pre- parar legislação nova sobre os elementos que contribuem para facilitar a cooperação judiciária e melhorar o acesso à justiça, tendo mencionado expressamente nesse contexto as injunções de pagamento em dinheiro. (4) Em 30 de novembro de 2000, o Conselho adotou um programa conjunto do Conselho e da Comissão de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões em matéria civil e comercial. O programa prevê a possibilidade de criação de um procedimento específico, uniforme ou harmonizado, estabelecido pela Comunidade, para obter uma decisão judicial em determinados domínios, incluindo o dos créditos não con- testados. A isto deu continuidade o Programa da Haia, adotado pelo Conselho Europeu a 5 de novembro de 2004, que instou à prossecução ativa dos trabalhos relativos à injunção de pagamento europeia. (5) Em 20 de dezembro de 2002, a Comissão adotou um Livro Verde relativo a um procedimento europeu de injunção de pagamento e a medidas para simplificar e acelerar as ações de pequeno montante. Este Livro Verde marcou o lançamento de consultas sobre os possíveis objetivos e as características de que poderia ser dotado um procedimento europeu uniforme ou harmonizado para a cobrança de créditos não contestados.
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