TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
271 acórdão n.º 609/16 2.4. Enquadrado genericamente o instituto da intervenção de terceiros, cumpre responder à questão supra enunciada, ou seja: se a respetiva supressão na ação especial prevista no Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro (resultado aqui alcançado por via interpretativa do artigo 17.º, n.º 1, deste diploma), importa violação do artigo 20.º da Constituição. 2.4.1. No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, expõe-se brevemente o propósito do diploma: “[…] A instauração de ações de baixa densidade que tem crescentemente ocupado os tribunais, erigidos em órgãos para reconhecimento e cobrança de dívidas por parte dos grandes utilizadores, está a causar efeitos perversos, que é inadiável contrariar. Na verdade, colocados, na prática, ao serviço de empresas que negoceiam com milhares de consumidores, os tribunais correm o risco de se converter, sobretudo nos grandes meios urbanos, em órgãos que são meras extensões dessas empresas, com o que se postergam decisões, em tempo útil, que interessam aos cidadãos, fonte legitimadora do seu poder soberano. Acresce, como já alguém observou, que, a par de um aumento explosivo da litigiosidade, esta se torna repetitiva, rotineira, indutora da ‘funcionalização’ dos magistrados, que gastam o seu tempo e as suas aptidões técnicas na prolação mecânica de despachos e de sentenças. É impossível uma melhoria do sistema sem se atacarem a montante as causas que o asfixiam, de que se destaca a concessão indiscriminada de crédito, sem averiguação da solvabilidade daqueles a quem é concedido. Não podendo limitar-se o direito de ação, importa que se encarem vias de desjudicialização consensual de certo tipo de litígios, maxime do que acima se apontou. Com efeito, a solução não é a de um quotidiano aumento de tribunais, de magistrados, de oficiais de justiça, na certeza de que sempre ficariam aquém das necessidades. É elevadíssimo o número de ações propostas para cumprimento de obrigações pecuniárias, sobretudo nos tribunais dos grandes centros urbanos. Como ilustração, atente-se em que, apenas nos tribunais de pequena instância cível de Lisboa, deram entrada nos anos de 1995, 1996 e 1997 respetivamente 46760, 56667 e 88523 ações, quase todas com o referido objeto. O artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro, previu a possibilidade da criação de processos com tramitação própria no âmbito da competência daqueles tribunais. É oportuno concretizar esse propósito, mas generalizando-o ao conjunto dos tribunais judiciais, pelo que se avança, no domínio do cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos que não excedam o valor da alçada dos tribunais de 1.ª instância, com medida legislativa que, baseada no modelo da ação sumaríssima, o simplifica, aliás em consonância com a normal simplicidade desse tipo de ações, em que é frequente a não oposição do demandado. Paralelamente, a injunção, instituída pelo Decreto-Lei n.º 404/93, de 10 de dezembro, no intuito de per- mitir ao credor de obrigação pecuniária a obtenção, ‘de forma célere e simplificada’, de um título executivo, no mesmo triénio mereceu uma aceitação inexpressiva, que se cifra, em todo o País, em cerca de 2500 providências por ano. À margem da sensibilização dos grandes utilizadores para o preocupante fenómeno que se verifica, e que está a contar com a sua adesão, deu-se um passo relevante com o Decreto-Lei n.º 114/98, de 4 de maio, que alterou o artigo 71.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, permitindo retirar dos tribunais a tarefa de meras entidades certificadoras de incobrabilidade de dívidas de montante já significativo, apenas para que os credores pudessem conseguir a dedução do IVA. Procura-se agora incentivar o recurso à injunção, em especial pelas possibilidades abertas pelas modernas tecno- logias ao seu tratamento informatizado e pela remoção de obstáculos de natureza processual que a doutrina opôs ao Decreto-Lei n.º 404/93, nomeadamente no difícil, senão impraticável, enlace entre a providência e certas questões incidentais nela suscitadas, a exigirem decisão judicial, caso em que a injunção passará a seguir como ação.
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