TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

252 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL em aplicação deste princípio pode abranger, designadamente, a dispensa de pagamento antecipado dos encargos judiciais e/ou a assistência de um advogado. Incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar se os requisitos de concessão do apoio judiciário constituem uma limitação do direito de acesso aos tribunais suscetível de prejudicar a essência desse direito, se têm um objetivo legítimo e se existe uma relação razoável de proporcionalidade entre os meios utilizados e o objetivo prosseguido. No âmbito dessa apreciação, o órgão jurisdicional nacional pode tomar em consideração o objeto do litígio, as hipóteses razoáveis de sucesso do requerente, a gravidade do que está em causa para este, a complexidade do direito e do processo aplicáveis bem como a capacidade de o requerente defender efetivamente a sua causa. Para apreciar a proporcionalidade, o órgão jurisdicional nacional pode também ter em conta a importância dos encargos judiciais que deve ser paga antecipadamente e o carácter insuperável, ou não, do obstáculo que estes eventualmente repre- sentam para efeitos do acesso à justiça. No que respeita mais concretamente às pessoas coletivas, o órgão jurisdicional nacional pode tomar em consi- deração a situação destas. Assim, pode tomar em conta, designadamente, a forma e o fim lucrativo ou não da pessoa coletiva em causa bem como a capacidade financeira dos seus sócios ou acionistas e a possibilidade de estes obterem as quantias necessárias para a propositura da ação.» Este entendimento do princípio da proteção jurisdicional efetiva consagrado no artigo 47.º da CDFUE afasta a ideia de uma necessária incompatibilidade entre o apoio judiciário prestado a pessoas coletivas com fins lucrativos e o bom funcionamento de mercados concorrenciais, como é o caso do mercado interno. Deste modo, o apoio judiciário não constitui forçosamente um fator de distorção da concorrência ou de favorecimento da litigância de sociedades comerciais; em especial, o mesmo não pode ser equiparado ou qualificado como um auxílio concedido pelo Estado ou proveniente de recursos financeiros públicos que falseia ou ameaça falsear a concorrência, favorecendo certas empresas (cfr. o artigo 107.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia). Diferentemente, e em função das circunstâncias em que a questão se coloque casuisticamente, aquele apoio pode constituir uma condição necessária da efetividade da tutela juris- dicional. Tudo depende, assim, do caso concreto: a situação do interessado, a sua situação de insuficiência económica e as circunstâncias do litígio. Por outro lado, o mesmo entendimento – em si, incompatível com uma disposição como a do artigo 7.º, n.º 3, da LADT, que, relativamente às sociedades comerciais e aos estabelecimentos individuais de res- ponsabilidade limitada, pura e simplesmente impede qualquer avaliação da situação concreta para efeitos de eventual concessão de apoio judiciário, seja no que se refere ao objeto do litígio, seja no respeitante à insufi- ciência económica invocada pelo interessado – não pode deixar de relevar no quadro de uma visão sistémica como aquela que é reclamada pelo Acórdão n.º 216/10. Basta pensar na hipótese de uma sociedade comer- cial, portuguesa ou nacional de um outro Estado-Membro da União Europeia, em dificuldades económicas devido à violação de normas de direito da União Europeia pelo Estado Português e que pretende efetivar a responsabilidade civil deste último: a impossibilidade absoluta de discutir – é esse o sentido da rejeição do pedido de proteção jurídica decidida in casu pelo recorrido – com as autoridades portuguesas competentes a sua insuficiência económica para efeitos de obtenção de proteção jurídica necessária a assegurar proteção jurisdicional efetiva é contrária ao artigo 47.º, terceiro parágrafo, da CDFUE e coloca-a numa situação de desigualdade face às sociedades em situação paralela noutros Estados-Membros. Por outro lado, admitir tal apreciação casuística sempre que estejam em causa litígios que impliquem a aplicação do direito da União Europeia (e, portanto, do citado preceito da Carta) cria uma desigualdade relativamente aos interessados em situações paralelas em que esteja em causa somente a aplicação do direito português.

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