TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
247 acórdão n.º 591/16 Atentas tais conclusões, a recorrente termina pedindo que seja apreciada a inconstitucionalidade da norma do artigo 7.º, n.º 3, da LADT: (a) «por violação dos artigos 12.º, 13.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa, na parte em que recusa proteção jurídica, nomeadamente apoio judiciário, a pessoas coletivas com fins lucrativos, sem consideração pela concreta situação económica das mesmas»; ou (b) se assim não se entender, e por violação dos mesmos parâmetros, «na parte em que recusa proteção jurídica, nomeadamente concessão de apoio judiciário, a pessoas coletivas com fins lucrativos que nas circunstâncias económico-finan- ceiras e sociais absolutamente excecionais mencionadas provando a sua insuficiência económica, demonstrem que o litígio para o qual é requerido o apoio exorbita da respetiva atividade económica normal, ocasionando custos consideravelmente superiores às possibilidades económicas das mesmas» (fls. 106-107). 3. Discutido o memorando elaborado pelo relator e fixada a orientação do Tribunal, cumpre formular a decisão (artigo 79.º-B, n.º 2, da LTC). II – Fundamentação 4. Resulta do artigo 7.º, n.º 3, da LADT, tal como interpretado e aplicado pela decisão recorrida, a exclusão liminar e absoluta – ou seja, sempre e em qualquer circunstância – da possibilidade de concessão de apoio judiciário a pessoas coletivas com fins lucrativos com base apenas na ideia de que a ordem jurídica impõe estatutariamente e, portanto, necessariamente a esse tipo de pessoas uma disponibilidade económica tal que impede as mesmas de ficarem numa situação de insuficiência económica justificativa da necessidade de proteção jurídica em qualquer das modalidades legalmente admitidas. Contudo, um tal entendimento, além de não se mostrar fundado em qualquer preceito constitucional, contende com a extensão e o alcance do conteúdo essencial do segmento do artigo 20.º, n.º 1, da Constituição , segundo o qual não pode «a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos». Com efeito, e contrariamente à ideia que perpassa na decisão recorrida de estar em causa um “mero” « preceito programático » (itálico adicionado), o acesso aos tribunais consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Cons- tituição é uma garantia imprescindível da proteção de direitos fundamentais e, como tal, inerente à ideia de Estado de direito: sem prejuízo da sua natureza de direito prestacionalmente dependente e de direito legalmente conformado, certo é que ninguém – pessoa singular ou pessoa coletiva, nacional ou não nacional – pode ser privado de levar a sua causa à apreciação de um tribunal (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, anot. I ao artigo 20.º, p. 408). O conteúdo deste direito não pode ser esvaziado ou praticamente inutilizado por insufi- ciência de meios económicos. Se os serviços de justiça não têm de ser necessariamente gratuitos, também não podem ser «tão onerosos que dificultem, de forma considerável, o acesso aos tribunais», pelo que «os encargos [com tal acesso terão] de levar em linha de conta a incapacidade judiciária dos economicamente carecidos e observar, em cada caso, os princípios básicos do Estado de direito, como o princípio da proporcionalidade e da adequação» (vide idem , ibidem , anot. VI ao artigo 20.º, p. 411). Nesta perspetiva, a concessão de prote- ção jurídica garantidora do direito de acesso aos tribunais corresponde a uma dimensão prestacional de um direito, liberdade e garantia (vide idem , ibidem ); não a uma simples refração do direito à segurança social (cfr. idem , ibidem , p. 412). 5. Por outro lado, segundo o artigo 12.º, n.º 2, da Constituição, «as pessoas coletivas gozam dos direi- tos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza». E não cabe qualquer dúvida que também as pessoas coletivas têm o direito de aceder aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legal- mente protegidos. O mesmo é dizer que o direito de acesso aos tribunais consagrado no artigo 20.º, n.º 1,
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