TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
236 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL isso envolva, como refere José Carlos Vieira de Andrade, o exercício pelo juiz do “[…] poder de adaptar a tramitação às circunstâncias do caso concreto” ( Os Direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976 , 4.ª edição, Coimbra, 2010, p. 227). Todavia, esta resposta – e a correspondente tarefa hermenêutica – cabe exclusivamente ao Tribunal da Relação, ao reformar a decisão em função do juízo de não inconstitucionali- dade. III – Decisão 3. Em face do exposto, indefere-se a reclamação deduzida pela recorrida A., mantendo-se a decisão reclamada que não julgou inconstitucional a norma que faz depender a interrupção do prazo em curso na ação judicial pendente da junção aos autos do documento comprovativo da apresentação de pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, resultante do n.º 4 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, e determinou a reforma da decisão recorrida em conformidade com o tal juízo de não incons- titucionalidade. Custas pela ora reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, tendo em atenção os critérios definidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (cfr. artigo 7.º do mesmo diploma), mas sem prejuízo do benefício do apoio judiciário reconhecido no processo. Lisboa, 3 de novembro de 2016. – Teles Pereira – Maria de Fátima Mata-Mouros – João Pedro Caupers (vencido, nos termos da declaração em anexo) – Claudio Monteiro (conforme declaração de voto do Conse- lheiro Vice-Presidente João Pedro Caupers) – Costa Andrade. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido relativamente à decisão tomada no Pleno da 1.ª Secção do Tribunal Constitucional por considerar desconforme à Constituição a interpretação normativa extraída do n.º 4 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, no sentido de a interrupção do prazo em curso na ação judicial pendente depender da junção aos autos do documento comprovativo da apresentação de pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono. Na verdade, o problema não está na exigência da junção aos autos de tal documento, em si mesma: reside ele em que tal interpretação, imposta sempre e em qualquer caso, por um lado, exige, na prática, que tal junção seja feita pelo interessado, nessa altura então ainda desprovido de acompanhamento por advogado; por outro lado, revela-se indiferente à circunstância de o juiz, no momento em que recebe o processo, ter neste o referido documento, entretanto entregue – fora de prazo, na interpretação normativa em causa – pelo mandatário judicial juntamente com a contestação. Desta interpretação resulta uma consequência que tenho por intolerável: o interessado, que precisa e obtém apoio judiciário, muitas vezes uma pessoa com menor instrução ou discernimento, vê-se irremediavel- mente lesado nos seus direitos pela imposição de um ónus, porventura justificado, mas cujo incumprimento gera consequências absolutamente desproporcionadas (cfr. Carlos Lopes do Rego, “Os princípios constitu- cionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade, dos ónus e cominações e o regime da citação em pro- cesso civil”, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa , pp. 839-840 e 842-843). Acresce, muito embora se admita não se recortar aí uma questão de constitucionalidade, que considero abusiva e inaceitável, num Estado de direito respeitador dos cidadãos, a imposição a estes da obrigação de
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