TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

218 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – Embora a falta de contestação em processo-crime não tenha, nem possa ter, por força do princípio constitucional da presunção de inocência, os efeitos cominatórios que tem, em regra, no processo civil, impondo a Constituição que a causa penal seja objeto de apreciação e decisão judiciais no «mais curto prazo», e não apenas «em prazo razoável», como exige para os demais processos, não se vê como sustentar, no plano constitucional, a reivindicação, por parte do recorrente, de um novo prazo de defesa, para apresentação de contestação e rol de testemunhas, quando já lhe foi reconhecido, no processo, o direito processual de contestar os factos imputados na acusação e carrear prova que demonstre a sua inocência e há muito que decorreu o prazo legal previsto para o efeito. V – No processo que deu origem ao presente recurso constitucionalidade foi assegurado ao arguido, ora recorrente, a possibilidade efetiva de intervir ativamente no processo e influir positivamente no julgamento, sustentando o recorrente, porém, que a decisão de reenvio do processo para novo jul- gamento, proferida pelo tribunal superior nos termos do artigo 426.º do Código de Processo Penal (CPP), implica o reconhecimento ao arguido de novo prazo para apresentar a contestação e o rol de testemunhas. VI – No entanto, no caso concreto, a razão que especificamente determinou a anulação do julgamento realizado pela primeira instância foi «a insuficiência para a decisão da matéria de facto», pressupondo o juízo formulado acerca da existência desse vício o confronto entre o objeto do processo e a matéria de facto que o tribunal indagou; ora, o objeto do processo fixa-se em momento processual anterior ao da audiência de julgamento, com a dedução da acusação e/ou decisão de pronúncia, que não só cons- tituem condição de intervenção do tribunal mas também limite material aos seus poderes de cognição e decisão, pelo que é evidente que a anulação do julgamento, por quaisquer dos vícios tipificados no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, não importa modificação do objeto do processo, que se mantém essencial- mente uno e idêntico em todas as fases do processo penal, sendo exatamente a mesma a matéria sobre a qual o arguido teve a possibilidade de se pronunciar e produzir prova e aquela sobre que recairá, por força da decisão de reenvio, o novo julgamento. VII – Nestes termos, mantendo-se a instância estável, também do ponto de vista do objeto do processo, não pode o arguido, a pretexto da decisão anulatória do tribunal superior, que não atinge as fases processuais anteriores à audiência de discussão e julgamento, pretender fazer mais tarde o que não fez em tempo oportuno – contestar e arrolar testemunhas; acresce que, considerando a natu- reza e gravidade dos vícios previstos no n.º 2 do artigo 410.º do CPP, entendeu o legislador ser de afastar a intervenção no novo julgamento dos juízes que participaram no anterior, em ordem a assegurar a independência e imparcialidade do tribunal, não havendo qualquer risco de o novo julgamento ser, sem isso, uma «aparência de novo julgamento», por mera repetição formal do anterior. VIII – Não há, pois, qualquer razão constitucional para censurar a solução que, no âmbito da decisão de reenvio para novo julgamento, não confere ao arguido, que já teve a possibilidade de se defender da acusação, novo prazo para o efeito; uma tal exigência, além de não encontrar fundamento nas garan- tias de defesa do arguido, implicaria, por regressiva, com o modelo constitucional de um processo penal célere e eficaz.

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