TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

214 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL As situações não são, pois, iguais, legitimando a desigualdade jurídica do objeto o tratamento diferenciado do feixe de direitos que se lhes associam. Por aqui, então, não existe qualquer afronta ao direito de igualdade.” Para só depois concluir que “Também não haverá (afronta ao direito de igualdade) quando esteja em causa o direito de preferência em relação à totalidade do prédio (..)”. É, pois, inequívoco que a alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil constituiu a ratio deci- dendi , tanto do pedido principal de exercício do direito de preferência relativamente à parte arrendada do prédio, como do pedido subsidiário de exercício daquele direito relativamente à totalidade do mesmo, e que em relação a ambos os pedidos o tribunal a quo aplicou aquela norma por entender que a mesma não padece, em nenhum dos segmentos interpretativos identificados, de nenhuma das inconstitucionalidades que lhe foram apontadas pelos autores e ora recorrentes. 2. Assim delimitado o objeto do recurso, como julgo que deveria ser, o sentido do meu voto não seria unívoco, na medida em que acompanho a maioria no entendimento de que o preceito legal em questão não é inconstitucional, se interpretado no sentido de não atribuir ao arrendatário de parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal o direito de preferência sobre a totalidade desse prédio, mas não subscreveria idêntica interpretação relativamente a um direito de preferência restrito à parte do prédio que constitui o objeto do arrendamento, se essa interpretação tivesse sido explicitamente assumida. Em minha opinião, não existem razões materiais que justifiquem a diferença de tratamento entre arren- datários de frações autónomas e de partes de prédios não constituídos em propriedade horizontal, pelo que que, nessa interpretação, a alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil viola o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição. Desde logo, porque essas razões materiais haveriam de se encontrar numa diferente situação de facto e de direito dos arrendatários de andares em prédios não constituídos em propriedade horizontal, e não na diferente situação jurídica do local arrendado, que é estranha à relação locatícia e cuja configuração não depende da sua vontade, na medida em que a propriedade horizontal pode ser livremente constituída e des- constituída pelo(s) proprietário(s) no decurso daquela relação, sem com ela interferir. Se o legislador considera – e teria em minha opinião liberdade para não o fazer – que a atribuição do direito de preferência na compra e venda do local arrendado constitui um caminho para a concretização do direito à habitação dos arrendatários consagrado no artigo 65.º da Constituição, na medida em que conso- lida e estabiliza a relação jurídica que estes mantêm com a sua casa de morada, teria que justificar em que é que o facto de aquele local não constituir uma unidade predial autónoma altera a natureza dos interesses tutelados. Não altera, obviamente, porque aqueles arrendatários não precisam menos de estabilidade jurídica do que os arrendatários de frações autónomas. Pelo contrário até, em caso de venda da totalidade do prédio ficam mais expostos à possibilidade de denúncia do contrato pelo senhorio para demolição ou realização de obras de remodelação ou restauro profundo, nos termos da alínea a) do artigo 1101.º do Código Civil, do que ficariam no caso de venda apenas da sua fração. Mas não altera, também, porque a sua posição jurídica enquanto arrendatários em nada difere das dos demais, já que o objeto e o regime do contrato de arrendamento não se definem pelo objeto e o regime do direito de propriedade do senhorio. O arrendamento é um direito pessoal de gozo que tem por objeto a coisa ou parte dela, e não aquele direito de propriedade. Por maioria de razão, o direito de preferência dos arrendatários tem de se definir pelo objeto do seu direito (de arrendamento) e não pelo objeto do direito (de propriedade) do senhorio.

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