TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

212 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL priedade, é também razoável que o direito de preferência a partir do arrendamento se projete por referência à mesma unidade jurídica, sendo ele tendente à aquisição do direito real; IX – Não estando vedado ao legislador a previsão, como objeto da preferência, de um direito tão amplo como aquele que resulta da atuação da teoria expansionista, a circunscrição desse objeto nos termos resultantes da chamada teoria do local também não está vedada, pois a distinção de regimes envolvida nesta última opção não se apresenta arbitrária ou carecida de fundamento racional na diferenciação das situações envolvidas: as que, no quadro de uma pretensão de exer- cício da preferência pelo arrendatário habitacional, podem conduzir a um tratamento diferen- ciado de quem é confrontado com a venda, exclusivamente, do seu “local arrendado” e quem é confrontado com um negócio abrangendo um espaço mais amplo do qual não é juridicamente destacável o correspondente ao objeto do arrendamento; X – O n.º 3 do artigo 65.º da Constituição encarrega o Estado de adotar uma política de acesso a habitação própria, mas essa finalidade pode alcançar-se por diversas vias, tratando-se de matéria em que o legislador goza de ampla margem de conformação. Por outro lado, o direito à habita- ção, por si só, não se reconduz unicamente no direito a habitar um imóvel propriedade própria, podendo realizar-se pela via do arrendamento; XI – Do artigo 65.º da Constituição não pode extrair-se a exigência imperativa de que uma das vias de realização do direito à habitação seja a da previsão legislativa de aquisição da propriedade, através do direito de preferência, a quem já dispõe de uma habitação arrendada, sobre um bem imóvel que exceda o locado; XII – Neste caso, não pode falar-se de restrição desproporcionada do direito dos arrendatários de aceder à propriedade do imóvel onde habitam, designadamente porque tal direito não existe com a pretendida configuração (enquanto direito fundamental previsto na Constituição), pelo que afastado está que possa ser desproporcionadamente restringido; XIII – Não se verifica que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capa- zes de gerar nos privados expectativas de continuidade ou exclusividade de uma determinada interpretação do alcance, quanto ao objeto, da preferência atribuída ao arrendatário habitacio- nal. Na verdade, não existe, à partida, um direito à não-frustração de expectativas jurídicas ou à manutenção do regime legal em relações jurídicas duradouras (como é o caso da relação de arrendamento) e a simples maior ou menor expressão de uma corrente jurisprudencial relativa ao alcance do direito de preferência do arrendatário, não configura qualquer “comportamento” (ativo) – seguramente não do legislador – gerador nos destinatários das normas de uma expec- tativa de manutenção ou de prevalência de uma ou outra das correntes interpretativas em jogo; XIV – Não existindo expectativas dignas de tutela num quadro em que se confrontam diferentes interpretações de uma norma pelos Tribunais, não podem afirmar-se legítima ou fundada em boas razões a pretensão de ver estabilizada, à margem da intervenção do legislador, uma ou outra das interpretações em jogo; XV – A interpretação que é referenciada como teoria do local não deixa de encontrar justificação no interesse em fazer coincidir o objeto da preferência com o objeto do arrendamento, não sacri- ficando a autonomia negocial do proprietário para além do que a proteção que se pretendeu conceder ao arrendatário justifica; XVI – Assim, não é inconstitucional a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do CC, na redação introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio.

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