TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

204 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “[…] [A teoria do local], perante as coordenadas atuais […] do arrendamento urbano é a preferível. Vamos ver. a ) A letra da lei: o artigo 1117.º, versão original, dava preferência na venda do ‘prédio arrendado’, retomando o 66.º/1 da L 2030; ora o RAU de 1990 (47.º) limitou a preferência à venda do ‘local arrendado’, numa locução mantida pela L 6/2006, vertida no 1091.º, hoje em vigor: Ora, devemos presumir que o legislador escolheu as suas palavras com critério, dizendo o que quis dizer (9.º/3): designadamente o de 2006, que já conhecia o alcance prático da polémica. b ) O elemento teleológico, sempre decisivo, diz-nos que a lei, ao atribuir preferência aos arrendatários, visou facultar-lhes o cesso à habitação ou a instalações próprias, pondo termo ao arrendamento. Ora, admitir a preferência para além do local arrendado é interferir no mercado, dando vantagem ao arrendatário que transcende o fim da lei. Transformar o inquilino de um fogo em dono do prédio (só) porque este não estava em propriedade horizontal, é uma operação de todo fora do objetivo legal, que apenas visaria lucrativos negócios imobiliários. c ) A ponderação das consequências mostra que a tese expansionista pode conduzir a resultados inaceitáveis. A multinacional que arrenda um telhado para nele instalar um painel publicitário adquire, por isso, uma pre- ferência na venda do edifício? Nenhuma valoração arrendatícia justificaria, jamais, semelhante resultado: a teoria expansionista é inconveniente. […]” (António Menezes Cordeiro, Leis do Arrendamento Urbano Anotadas , cit., p. 262). Da mesma forma, a opção pela teoria expansiva, sempre assentou numa construção interpretativa ela- borada sobre uma base textual assumida como aberta a mais de uma leitura, recorrendo-se a elementos inter- pretativos num quadro de reconstituição do pensamento legislativo, quanto a uma incidência particular não prevista no texto de forma explícita. Veja-se, como exemplo da afirmação da teoria expansiva, o acórdão do STJ de 12 de janeiro de 2012, proferido no proc. n.º 72/2001-L1.S1: “[…] Entendeu o tribunal ‘a quo’ que a introdução, no texto da lei, da expressão local arrendado limitaria o direito de preferência ao andar ou à parte do prédio efetivamente dada de arrendamento impedindo o ou os arrendatários de preferir na compra e venda da totalidade de um prédio não constituído em propriedade horizontal. Desde logo o confronto dos dois números em que o artigo se decompõe leva-nos a uma interpretação não res- tritiva do preceito ( ‘actus debet interpretari ut aliquid operetur non ut sit inanis et inutilis’ ). Diz o n.º 2 do artigo 47.º do RAU que sendo dois ou mais preferentes, abre-se entre eles licitação, revertendo o excesso para o alienante. Os preferentes a que este número se refere são, em princípio, os locatários habitacionais do prédio arrendado. O n.º 2 restaria sem âmbito de aplicação em situações de não constituição da propriedade horizontal, pois não seria curial abrirem-se licitações concorrenciais entre o preferente do andar ou parte do prédio locado e os demais locatários do restante prédio. Em caso de propriedade horizontal o preferente na compra e venda do andar locado é, em princípio, o locatário do andar arrendado e não os demais locatários dos restantes andares. Não é este, contudo, o argumento decisivo: é que nem do preâmbulo do decreto-lei, nem da análise dos tra- balhos preparatórios decorre ter o legislador tido a intenção de afastar o direito de preferência do locatário habita- cional na compra e venda de todo o imóvel. Pode impressionar o facto de o legislador ter introduzido, no n.º 1 do artigo 47.º, a expressão “local arrendado”, só que tal expressão não é sinónimo, apenas, de andar arrendado mas de todo o imóvel onde o arrendamento se situa. Se o legislador tinha a intenção de restringir a preferência aos casos de compra e venda de prédio constituído em propriedade horizontal devia tê-lo dito no artigo 47.º, dando-lhe redação diversa. Não o tendo feito não pode a interpretação restringir com base em expressões de alcance dúbio ( favorabilia amplianda, odiosa restringenda ). […]” (texto disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf ) .

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