TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

198 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “[…] Ainda que existisse autonomia física do andar arrendado, inserido nesse mesmo prédio urbano, ele não tinha autonomia jurídica ante o conceito de coisa definido pelos artigos 202.º e 203.º, ambos do CC. A autonomia jurídica só seria alcançada se o prédio fosse constituído em propriedade horizontal – artigos 1414.º e 1415.º, ambos do CC. E, a constituição do prédio em propriedade horizontal por decisão judicial não é defensável, por três razões: Primeiro, porque ela apenas pode ter lugar em ação de divisão de coisa comum ou em processo de inventário, não em ação declarativa comum como a presente – artigo 1417.º, n.º 1, do CC; Segundo, porque embora timidamente a refiram, os recorrentes nunca pediram, expressa ou implicitamente, a constituição da propriedade horizontal e, a eventual decisão nesse sentido configuraria violação clara do princípio do dispositivo – artigo 609.º, n.º 1, do CPC; Terceiro, porque tal decisão não teria qualquer fundamento, visto que, ou existe previamente direito de pre- ferência e o seu exercício é facultado ao arrendatário, ou, ele não existe e não se o vai buscar na imposição da constituição futura do prédio em propriedade horizontal, ingerindo de forma inadmissível na esfera dos poderes do proprietário, a quem compete a decisão livre de o fazer ou não. […]”. E conclui-se a este respeito: “[…] Tudo o que fica exposto é suficiente para não ser concedido, por via do artigo 1417.º, n.º 1, do CC, o direito de os autores arrendatários preferirem em parte do prédio vendido. […]”. Daí que o Supremo Tribunal de Justiça tenha afirmado, “[q]uanto à preferência sobre o prédio”, que “[a] questão [se resolveria] pela interpretação da redação do artigo 1091.º, n.º 1, do CC […]”. Foi, pois, sobre um comando normativo em que não estava em causa uma dação em cumprimento, e do qual se excluiu a alienação apenas do local arrendando – por razões assentes na ponderação de normas diversas do artigo 1091.º, n.º 1, alínea a) , do CC e de incidências específicas da situação processual confi- gurada pelos recorrentes como autores da ação –, que a interpretação considerada inconstitucional se forjou e tornou atuante na solução do caso concreto. Tenha-se presente que os recorrentes, confrontados com a venda da totalidade do prédio onde se situa o seu locado, se propuseram exercer judicialmente um direito de preferência, que entendem assistir-lhes, especificamente quanto ao respetivo locado ou, subsidiariamente, quanto à totalidade do prédio vendido, sendo que, em qualquer dos casos, a possibilidade de formação desse direito de preferência foi considerada afastada em função do objeto da venda corresponder a todo o prédio, extravasando, pois, do espaço predial objeto do arrendamento. Valeria aqui, todavia – é a posição sustentada no recurso –, uma determinada leitura do artigo 1091.º, n.º 1, alínea  a) , do CC, que os recorrentes reputam de constitucionalmente imposta, no sentido de permitir (de impor) a expansão da preferência do arrendatá- rio urbano a todo o espaço predial objeto de transmissão, mesmo que este não coincida, por excesso, com o local arrendado. No entanto, o Supremo Tribunal de Justiça – como decorre do excerto da fundamentação acima trans- crito – excluiu liminarmente que o local arrendado pudesse, só por si, constituir objeto de um negócio jurídico destacado da venda integral do prédio, pelo que – independentemente da enunciação formal – materialmente essa possibilidade não integrou a  ratio decidendi , correspondendo antes a passos prévios do percurso em função do qual se alcançou essa ratio , atentas as particularidades da ação (aliás, particularidades de índole processual que foram consideradas inultrapassáveis no quadro desta ação). Tenha-se presente não

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