TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

190 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – A causa 1. A. e mulher B. (os ora recorrentes) intentaram contra C. e mulher, D., E. e F. uma ação declarativa sob a forma de processo ordinário, a qual correu os seus termos nas (hoje extintas) Varas Mistas de Loures com o n.º 9065/12.1TCLRS. Nesta ação pretenderam os autores exercer um direito de preferência, decor- rente da posição de arrendatários habitacionais, formulando a tal respeito os seguintes pedidos: (a) a título principal, que lhes fosse reconhecido o direito de preferência como arrendatários numa venda, que teve lugar em 10 de julho de 2012 e que os segundo e terceiro réus efetuaram aos primeiros, de um prédio, referindo-se a preferência, neste caso, ao 1.º andar correspondente ao locado; e, (b) a título subsidiário, para a hipótese de não poder ser atendido o pedido principal por o prédio não se achar submetido ao regime de propriedade horizontal, nem ser possível a constituição desse regime por decisão judicial, que lhes fosse reconhecido, com a mesma base, o direito de preferência em relação à venda de todo o prédio. Para integral compreensão da situação, sublinha-se que a venda que desencadeou a preferência incidiu sobre a totalidade de um prédio urbano, composto de vários pisos e não constituído em propriedade horizontal, pretendendo os autores, que são arrendatários apenas de um apartamento no 1.º andar, preferir quanto à sua parte (ao 1.º andar) e subsidiariamente quanto à totalidade do prédio objeto dessa venda. Contestaram os réus estas pretensões, defendendo não estarem integrados os pressupostos da preferência legal atribuída ao arrendatário habitacional. 1.1. Findos os articulados, foi proferido despacho saneador (fls. 131/141) com conhecimento do mérito, julgando a ação totalmente improcedente. Em suma, considerou-se que o artigo 1091.º, n.º 1, alínea a) , do Código Civil (CC), na redação introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, restringe o exercício da preferência do arrendatário aos casos em que exista autonomização jurídica do local arrendado, não podendo esta, referida que está a um determinado local, ser transformada em mecanismo para a aquisição de todo o prédio. Consequentemente, o direito de preferência apenas tem a extensão do direito ao arrendamento. Assim, tratando-se de venda da totalidade do prédio, os autores, como arrendatários de uma sua parte não autonomizada, não gozam do direito de preferência, em especial. Foi o que se concluiu no saneador-sentença e determinou a improcedência da ação. 1.2. Inconformados com a decisão, os autores dela interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, alegando, designadamente, o seguinte: “[…] III – O direito de preferência do locatário habitacional tem dignidade constitucional 5. O direito de preferência do locatário habitacional foi instituído pela Lei n.º 63/77, de 25.08, para dar exe- cução ao comando do artigo 65.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, como resulta do preâmbulo desta lei ordinária. E foi instituído por ser um dos meios de o locatário habitacional aceder a habitação própria, finalidade esta que o Estado ficou obrigado, constitucionalmente, a prosseguir. Ficou – e continua estando – obrigado a isso já que as sucessivas revisões constitucionais mantiveram aquele comando, ínsito, agora, na alínea c) do n.º 2 do dito artigo 65.º, onde se prescreve que incumbe ao Estado ‘esti- mular … o acesso à habitação própria’. […]

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=