TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

189 acórdão n.º 583/16 venda, exclusivamente, do seu “local arrendado” e quem é confrontado com um negócio abrangendo um espaço mais amplo do qual não é juridicamente destacável o correspondente ao objeto do arren- damento. X – O n.º 3 do artigo 65.º da Constituição encarrega o Estado de adotar uma política de acesso a habita- ção própria, mas essa finalidade pode alcançar-se por diversas vias, tratando-se de matéria em que o legislador goza de ampla margem de conformação. Por outro lado, o direito à habitação, por si só, não se reconduz unicamente no direito a habitar um imóvel propriedade própria, podendo realizar-se pela via do arrendamento. XI – Do artigo 65.º da Constituição não pode extrair-se a exigência imperativa de que uma das vias de realização do direito à habitação seja a da previsão legislativa de aquisição da propriedade, através do direito de preferência, a quem já dispõe de uma habitação arrendada, sobre um bem imóvel que exce- da o locado. XII – Neste caso, não pode falar-se de restrição desproporcionada do direito dos arrendatários de aceder à propriedade do imóvel onde habitam, designadamente porque tal direito não existe com a pretendida configuração (enquanto direito fundamental previsto na Constituição), pelo que afastado está que possa ser desproporcionadamente restringido. XIII – Não se verifica que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade ou exclusividade de uma determinada interpretação do alcance, quanto ao objeto, da preferência atribuída ao arrendatário habitacional. Na verdade, não existe, à partida, um direito à não-frustração de expectativas jurídicas ou à manutenção do regime legal em relações jurídicas duradouras (como é o caso da relação de arrendamento) e a simples maior ou menor expressão de uma corrente jurisprudencial relativa ao alcance do direito de preferência do arrendatário, não configura qualquer “comportamento” (ativo) – seguramente não do legislador – gerador nos destinatários das normas de uma expectativa de manutenção ou de prevalência de uma ou outra das correntes interpretativas em jogo. XIV– Não existindo expectativas dignas de tutela num quadro em que se confrontam diferentes interpre- tações de uma norma pelos Tribunais, não podem afirmar-se legítima ou fundada em boas razões a pretensão de ver estabilizada, à margem da intervenção do legislador, uma ou outra das interpretações em jogo. XV – A interpretação que é referenciada como teoria do local não deixa de encontrar justificação no inte- resse em fazer coincidir o objeto da preferência com o objeto do arrendamento, não sacrificando a autonomia negocial do proprietário para além do que a proteção que se pretendeu conceder ao arren- datário justifica. XVI– Assim, não é inconstitucional a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil, na redação introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade hori- zontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio.

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