TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
17 acórdão n.º 510/16 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. A A., S. A., recorrida nos presentes autos em que é recorrente o Ministério Público, foi condenada em 21 de maio de 2014 pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) por ter diminuído a retri- buição dos seus trabalhadores [uma contraordenação prevista e punida pelos artigos 129.º, n.º 1, alínea d) , e 554.º, n.º 4, alínea e) , ambos do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro], na coima de € 12 444 e, ainda, no pagamento de € 177 284,47 devidos aos trabalhadores e de € 69 220,62 devidos à Segurança Social. Inconformada, a arguida impugnou judicialmente aquela decisão. Em 22 de janeiro de 2016, a Instância Central – 1.ª Secção Trabalho – Braga – Juiz 2, julgou parcial- mente procedente a impugnação, mantendo apenas a condenação da arguida a pagar o valor da coima em que fora condenada, considerando que: «[A]pós deliberação da respetiva assembleia geral de acionistas, [a arguida] reduziu os salários de todos os seus colaboradores cujo salário bruto mensal excedesse os 700 € , o que fez por escalões de vencimento, de forma progressiva, e de forma unilateral, uma vez que não obteve o acordo dos trabalhadores para tal redução salarial. Esta situação factual, que não foi contestada pela arguida, viola, sem dúvidas, a proibição constante do artigo 129.º, n.º 1, alínea d) , do Código do Trabalho, que estabelece um princípio de irredutibilidade da retribuição, no sentido de não poder ser diminuído o vencimento do trabalhador, nem com o seu acordo, salvo raras exceções previstas na lei. No caso em apreço, verifica-se que a redução salarial incidiu mesmo sobre a retribuição base, sendo certo que não resulta dos autos qualquer circunstância que legitimasse, do ponto de vista legal ou contratual, tal redução. Com efeito, não se tratava, pelo menos na altura, de empresa em situação económica difícil, que pudesse recorrer ao DL n.º 353-H/77, de 29 de agosto, nem foi invocado qualquer instrumento de regulamentação coletiva de trabalho donde adviesse tal redução salarial. Assim, ao agir da forma como ficou provado, a arguida violou as imposições legais em questão, sendo que poderia e deveria ter agido de forma diferente.» (fls. 194, 195) Já no que se refere à legitimidade da ACT para condenar a arguida a pagar aos trabalhadores as dife- renças salariais e os descontos para a Segurança Social, entendeu o mesmo tribunal dever recusar aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, ao disposto no artigo 564.º, n.º 2, do Código do Trabalho pelas seguintes razões: «[O] segmento da decisão da ACT que “determina o pagamento das importâncias em dívida aos trabalhadores no montante de € 177 284,47 e à Segurança Social no montante de € 69 220,62” funda-se no n.º 2 do artigo 564.º do Código do Trabalho. Tal norma, que repete a constante do n.º 5 do artigo 687.º do Código do Traba- lho na versão de 2003, preceitua que: “A decisão que aplique a coima deve conter, sendo caso disso, a ordem de pagamento de quantitativos em dívida ao trabalhador, a efetuar dentro do prazo estabelecido para o pagamento da coima.” Apesar da boa intenção do legislador de pôr rapidamente à disposição dos trabalhadores os quantitativos a que legitimamente têm direito, é difícil compatibilizar tal preceito com a natureza sancionatória do direito das contraordenações. Sobre esta questão, seguimos a posição de Soares Ribeiro, que passamos a citar: “O problema da constitucionalidade da atribuição de competência à Administração para a instrução dos processos por contraordenação e para aplicação das respetivas sanções foi objeto de viva polémica na altura da sua implantação em finais da década de setenta e princípio da década de oitenta.
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