TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
160 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL sistema segundo o qual o valor da prova é dado por critérios legais-abstratos que o predeterminam, dotados de um caráter de generalidade [que é o sistema da prova legal], o princípio da prova livre evidencia a dimen- são concreta da justiça e reconhece que a procura da verdade material não pode prescindir da consideração das circunstâncias concretas do caso em que essa verdade se recorta. Esta justiça, que conta com o sistema da prova livre (ou prova moral) não se abre, de ser assim, ao arbítrio, ao subjetivismo ou à emotividade. Esta justiça exige um processo intelectual ordenado que manifeste e articule os factos e o direito, a lógica e as regras da experiência. O juiz dá um valor posicional à prova, um significado no contexto, que entra no discurso argumentativo com que haverá de justificar a decisão. Este discurso é um discurso “mediante fundamentos que a ‘razão prática’ reconhece como tais” (Kriele), pois que só assim a obtenção do direito do caso está “apta para o consenso”. A justificação da decisão é sempre uma justificação racional e argumentada e a valoração da prova não pode abstrair dessa intenção de racionalidade e de justiça. 6. Acórdão n.º 542/97: a. Neste acórdão é acompanhando Figueiredo Dias, ob. loc. cit., dir-se-á que “o princípio não pode de modo algum querer apontar para uma apreciação imotivável e incontrolável – e portanto arbitrária – da prova produzida. Se a apreciação da prova é, na verdade, discricionária, tem evidentemente esta discricionarie- dade (como já dissemos que a tem toda a discricionariedade jurídica) os seus limites que não podem ser licitamente ultrapassados: a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada ‘verdade material’ –, de tal sorte que a apreciação há de ser, em concreto, reconduzível a critérios objetivos e, portanto, em geral suscetível de motivação e de controlo (possa embora a lei renunciar à motivação e ao controlo efetivos)”. 7. Acórdão n.º 391/15: a. Versando sobre presunções judiciais, neste aresto faz-se referência a Vaz Serra ( Revista de Legislação e de Jurisprudência , Ano 108.º, n.º 3559, p. 352), que caracterizando esta figura, referiu que as presunções «pressupõem a existência de um facto conhecido (base das presunções), cuja prova incumbe à parte que a presunção favorece e pode ser feita pelos meios probatórios gerais; provado esse facto, intervém a lei (no caso de presunções legais) ou o julgador (no caso de presunções judiciais) a concluir dele a existência de outro facto (presumido), servindo-se o julgador, para esse fim, de regras deduzidas da experiência de vida». Na verdade, a utilização de presunção judicial permite que perante um ou mais factos conhecidos, por um procedimento lógico de indução, se adquira ou se admita a realidade de um facto não diretamente demonstrado, na convicção, apoiada nas regras da ciência, da experiência ou da normalidade da vida, de que certos factos são a consequência de outros. E é no valor da credibilidade do id quod e na consistência da conexão causal entre o que se conhece e o que não se apurou de uma forma direta que está o fundamento racional da presunção, residindo na medida desse valor e dessa consistência a maior ou menor validade da inferência efetuada. Concluir-se pela prova de um facto em resultado do funcionamento de uma presunção é compatível, em processo penal, com uma presunção geral de inocência e com o princípio in dubio pro reo . Quando o valor da credibilidade do id quod e a consistência da conexão causal entre o que se conhece e o que não se apurou de uma forma direta atinge um determinado grau que permite ao julgador inferir este último elemento, com o grau de probabilidade exigível em processo penal, a presunção de inocência resulta ilidida por uma presunção de significado contrário, pelo que não é possível dizer que a utilização deste meio de prova atenta contra a presunção de inocência ou contra o princípio in dubio pro reo . O que sucede é que a presunção de inocência é superada por uma presunção de sinal oposto prevalecente, não havendo lugar a uma situação de dúvida que deva ser resolvida a favor do réu. 8. Perante a fundamentação supra alinhada enunciada por parte deste Colendo Tribunal Constitucional para se decidir pela improcedência do recurso interposto, o que se constata logo no primeiro impacto é que são vários os acórdãos que este Tribunal já proferiu sobre a problemática da norma ínsita no artigo 127.º do CPP.
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