TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
151 acórdão n.º 578/16 do ilícito contraordenacional» justificaria uma diferença de tratamento, ao nível substantivo e processual, daquele ilícito face ao ilícito penal. 46. Por outro lado, e dizendo que se mantem «na mesma linha», o Tribunal Constitucional invoca a doutrina de Nuno Brandão, a qual se baseia na ideia de que a circunstância de o direito de mera ordenação social não implicar, em nenhuma circunstância, a privação da liberdade do arguido justificaria uma diminuição das garantias processuais associadas ao processo contraordenacional. 47. Por fim, o Tribunal Constitucional invoca a circunstância de, na fase judicial, o arguido ter a possibilidade de carrear para os autos todos os elementos que sejam relevantes para a sua defesa, exercendo o contraditório nessa fase (para o efeito, o Tribunal Constitucional invoca o Acórdão n.º 373/15 e a doutrina de Paulo Pinto de Albu- querque). 48. Ora, perante tal cenário é necessário concluir que o Tribunal Constitucional não estava autorizado a adotar imediatamente uma Decisão Sumária sobre esta questão, sem convidar previamente os Arguidos a apresentarem as suas Alegações. 49. Ou seja: perante tal cenário, não se pode dizer que «a questão a decidir é simples, designadamente por a mesma já ter sido objeto de decisão anterior do Tribunal ou por ser manifestamente infundada» (cfr. artigo 78.º-A da LTC). Por várias razões: 50. Em primeiro lugar, nenhum dos Acórdãos invocados pelo Tribunal Constitucional na sua Decisão Sumá- ria analisa, direta e especificamente, a questão de inconstitucionalidade normativa agora colocada sob apreciação jurisdicional: a) No Acórdão n.º 73/12 estava em causa a possibilidade de os coarguidos estarem presentes e intervirem no momento de apresentação da Defesa de um outro arguido (ou seja: naquele momento de apresentação de Defesa que se encontra previsto no artigo 50.º do Regime Geral das Contraordenações e Coimas e que, na Lei da Concorrência — aplicável no caso em análise —, vinha prevista no artigo 26.º). Nomeadamente, estava em causa a situação em que tal Defesa é apresentada oralmente com posterior redução a escrito. Nesse caso, o Tribunal Constitucional referiu que «do principio do contraditório não resulta – nem em processo contraordenacional, nem, acrescente-se, em processo penal – o direito de um arguido presenciar e/ou intervir na apresentação da defesa de um outro arguido, que como vimos, é do que trata a audição oral aqui questionada». No caso dos presentes autos, o problema de inconstitucionalidade normativa é completamente diferente e nada tem a ver com o momento legalmente previsto para a apresentação da Defesa dos arguidos. No presente caso, o que está em causa é a possibilidade de aproveitar, em fase judicial, os depoimentos de testemunhas e, bem assim (numa outra interpretação normativa), as declarações dos coarguidos prestadas fora do tal momento de apresentação de Defesa previsto no artigo 50.º do Regime Geral das Contraordenações e Coimas e no artigo 26.º da Lei da Concorrência, que tenham sido realizadas na fase administrativa. b) No Acórdão 373/2015, o que estava em causa era a possibilidade de ser agravada a coima em sede de impug- nação judicial interposta pelo arguido em sua defesa, sem correspondente alteração e/ou agravamento dos factos, elementos e circunstâncias da decisão administrativa condenatória. Como tal, trata-se também de uma questão completamente diferente daquela que agora se encontra sub judice . 51. Em segundo lugar, o Tribunal Constitucional convoca simultaneamente, para fundamentar a sua solução final, quer a sua própria Jurisprudência (que, como vimos, não trata direta e especificamente do presente tema de inconstitucionalidade normativa), quer a doutrina de Nuno Brandão. 52. Acontece que tais fundamentos simultâneos são inconciliáveis. 53. Desde logo, porque Nuno Brandão critica severamente a conceção doutrinal que fundamenta a jurispru- dência corrente do Tribunal Constitucional nesta matéria e que pode ser percebida pelo Acórdão n.º 73/12 que se encontra citado na Decisão Sumária reclamada.
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