TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

148 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 8. Nesse sentido, conclui o Tribunal Constitucional que «perante a existência de um fundamento alternativo da decisão, uma eventual procedência da pretensão dos recorrentes “[…] não se revestiria de qualquer efeito útil, pois a decisão objeto do recurso de constitucionalidade sempre se manteria com base no fundamento que não vem questionado” (Acórdão n.º 53/14)» — cfr. ponto 2.4.1. 9. Com o devido respeito, tal argumentação é improcedente. 10. Para que o Tribunal Constitucional possa conhecer de uma alegada questão de inconstitucionalidade nor- mativa, é necessário que a mesma tenha constituído a ratio decidendi da sentença recorrida. 11. Contudo, o inverso também tem de ser verdadeiro.    12. Ou seja, o Tribunal Constitucional apenas pode decidir não conhecer de uma questão de inconstituciona- lidade normativa, pelo facto de existir um fundamento alternativo de decisão, quando o mesmo seja real e efetivo, ou seja, tenha real e efetivamente integrado a ratio decidendi da decisão recorrida. 13. Ao invés, o Tribunal Constitucional já não poderá decidir não conhecer de uma questão de inconstitucio- nalidade normativa quando tal fundamento alternativo de decisão se revele, a final, como um mero obiter dictum do julgador, ou seja, um comentário lateral sem qualquer relevância para a oportunidade processual e para o con- teúdo material da decisão em crise. 14. É o que se passa no caso agora sob análise. 15. Ainda que o Tribunal recorrido (o TRL) tenha afirmado que «sempre a mesma [correção de sentença] se impunha em consequência do decidido por este tribunal quanto à questão do concurso, suscitada pelo Ministério Público no seu recurso», 16. É manifestamente evidente que tal afirmação não teve nenhuma relevância para a oportunidade processual da “correção de sentença” agora em causa, nem teve nenhuma relevância para o respetivo conteúdo material (ou seja: tal afirmação não faz parte da ratio decidendi da “correção de sentença”). 17. Por uma razão simples: o Recurso do Ministério Público (adiante MP) pedia que os Arguidos fossem «con- denados não apenas pela prática de uma infração pp pelo artigo 211.º, g) do RGICSF mas por duas, à semelhança da decisão do BdP», 18. Invocando para o efeito que «o Tribunal violou assim as normas conjugadas dos artigos 211.º, g) , 115.º, 130.º, n.º 2, e) do RGICSF, do Aviso 1/2005 do BdP, da IAS 27, da SIC 12, da IAS 39, da IFRS 7 e do artigo 30.º, n.º 1, do CP». 19. Ou seja: o MP nunca pediu, sequer indiretamente, a correção da sentença recorrida, mas antes a sua revoga- ção e substituição por uma outra que condenasse os arguidos por concurso efetivo de infrações; mais: o MP nunca alegou, sequer indiretamente, qualquer ‘lapso material’ do Tribunal recorrido (que justificasse uma ‘correção de sentença’), mas antes a violação de um conjunto de disposições normativas. 20. Ora, para efeitos de decisão sobre o Recurso interposto pelo MP, como é jurisprudência pacífica, o TRL estava estritamente vinculado pelas conclusões desse mesmo Recurso — as quais nem sequer remotamente falavam de qualquer ‘lapso material’ ou ‘correção de sentença’, 21. O que significa que, em rigor, para efeitos de decisão sobre o Recurso interposto pelo MP, o TRL apenas podia recusar provimento a esse mesmo Recurso, confirmando a sentença de 1.ª instância, no sentido de existir um mero concurso aparente de infrações, 22. Ou, ao invés, dar provimento a esse mesmo Recurso, revogando a sentença de 1.ª instância, com base em violação de lei, e substituindo a mesma por outra que condenasse os arguidos por concurso efetivo de infrações. 23. A estrita vinculação do TRL às conclusões do Recurso do MP, não permitia terceira alternativa (note-se que a 3.ª Conclusão do Recurso do MP dizia o seguinte: «a cada um dos sete arguidos deverão ser aplicadas duas coimas: uma pela violação da 1.ª parte do artigo 211.º, g) , do RGICSF (ausência de relevação contabilística da H.); outra pela violação da 2.ª parte deste preceito (ausência de reconhecimento de ativos e passivos financeiros e respetivos resultados), assim se desdobrando em duas as infrações que o Tribunal aglutinou numa só»). 24. Conforme resulta de p. 396 a 399 do seu Acórdão, o TRL optou pela primeira alternativa (ou seja, recu- sou provimento ao Recurso do MP), decidindo, «tal como o tribunal recorrido, que existe apenas uma única

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=