TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

114 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «3.2.2. Decisão da questão da violação dos princípios da proporcionalidade e da proteção a confiança  A Requerente invoca afetação da expectativa que os contribuintes (proprietários de bens imóveis à data da aprovação da nova lei) criaram de que não existiria tributação extraordinária e imprevisível pela detenção do seu património, mas não há qualquer fundamento para formação de consistentes expectativas nesse sentido. Na verdade, a tributação direta ou indireta do património imobiliário t[e]m sofrido evolução ao longo do tempo, com frequentes alterações: nos últimos 30 anos, passou-se da tributação indireta do património por via da tributação do rendimento real ou presumível dos prédios que era feita na Contribuição Predial, vigente até ao final de 1988, para a Código da Contribuição Autárquica, que tributou diretamente o património até ao final de 2003, e para o Imposto Municipal sobre Imóveis que continuou esta tributação em novos moldes, a partir de 2004, estes últimos cumulativamente, a partir de 1989, com tributação dos rendimentos prediais a nível de impostos sobre o rendimento. Paralelamente, a tributação das alterações da titularidade dos imóveis que era efetuada através da sisa e do imposto sobre as sucessões e doações, que vigorou até ao final de 2003, foi eliminada passou a existir tributação das transmissões a título de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis e de Imposto do Selo. Por isso, não se vê fundamento para consistentes expectativas dos proprietários de imóveis no sentido da eternização ou prolongada vigência da tributação existente no início de 2012. Pelo menos é seguro, para utilizar a terminologia usada pela Requerente, que as eventuais «expectativas de estabilidade do regime jurídico em causa» não foram «induzidas ou alimentadas por comportamentos dos poderes públicos». Por outro lado, como se explica na Proposta de Lei n. 96/XII/2.ª, que se transcreveu parcialmente, a situação económico-financeira do País exigiu um esforço de consolidação orçamental, controladamente imposto pelos cre- dores internacionais, que teve de se traduzir não apenas na redução das despesas, mas principalmente no aumento das receitas do Estado. Este aumento de receitas foi efetuado primacialmente através do aumento da tributação dos rendimentos do trabalho e de pensões, mas, preocupações elementares de justiça impunham que se procurasse concretizar um[a] “efetiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento» e «garantir que a repar- tição desses sacrifícios será feita por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho”.  Neste contexto de adoção de medidas de consolidação orçamental exigidas para atenuar a crise financeira em que o país se encontra, não se pode concluir que a alteração parcial do regime de tributação do património imobi- liário operada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, pudesse implicar frustração de expectativas legítimas dos proprietários de imóveis de elevado valor. Na verdade, para além de, como se disse, a evolução legislativa não fornecer suporte sólido para formação de expectativas sobre a inalterabilidade da tributação do património, decerto que as hipotéticas expectativas que os proprietários de imóveis formassem no sentido de ficarem resguardados do enorme esforço nacional generalizado que exigiu a consolidação orçamental, não poderiam ser consideradas legítimas, por não serem compatíveis com o princípio constitucional da justiça. Por isso, não se pode deixar de concluir que ocorreram razões de interesse público que justificaram, em ade- quada ponderação, a não continuidade do regime de tributação do património imobiliário existente antes da criação da verba 28 da TGIS. Por outro lado, o aumento da tributação dos titulares de direitos sobre prédios destinados a habitação de valor elevado não se afigura desproporcionada, especialmente quando comparada com o generalizado agravamento da tributação do trabalho e pensões. Assim, como bem refere a Autoridade Tributária e Aduaneira, o limite a discricionariedade legislativa nesta matéria, é apenas o que resulta da proibição da retroatividade constitucionalmente estabelecida no artigo 103.º, n.º 3, da CRP, que, manifestamente, não é violado quanto à aplicação, no ano de 2014, da tributação prevista na verba 28.1 da TGIS, pois a redação desta norma que se aplica foi introduzida pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, em vigor desde 1-1-2014. Pelo exposto, não ocorre a alegada violação do princípio da proteção da confiança e do princípio da propor- cionalidade.»

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