TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

89 acórdão n.º 136/16 Retira-se das normas previstas nos artigos 12.º, 18.º, 22.º e 26.º do Decreto-Lei n.º 38/2015 que os órgãos de governo próprios das regiões autónomas são sempre consultados no âmbito da elaboração de um plano de situação ou de afetação. Especificamente no que respeita às zonas adjacentes aos arquipélagos res- petivos, possuem as Regiões um direito de elaboração do plano, concorrente com o do Governo. Além do mais, o plano é sempre aprovado pelo Governo, ainda que tenha sido elaborado pelos órgãos de governo próprios das Regiões. Em face deste regime, tem que concluir-se que à Região é outorgado mais do que o direito de manifestar opinião, nos termos decorrentes do direito de audição. O direito de elaborar planos de situação e de afetação tem, certamente, relevância, fazendo acrescer significativamente o grau de participação dos órgãos da Região, em rela- ção ao que corresponderia a um mero direito a ser ouvidos quanto a planos elaborados por entidades estaduais. Mas não está previsto nenhum modo de o plano assim elaborado se projetar na fase decisória, de alguma forma juridicamente limitativa ou condicionante do sentido da decisão final do órgão de soberania, pelo que não se oferece nenhuma garantia, por mínima que seja, de esta integrar interesses regionais, tal como representados pelos órgãos próprios da Região. É de concluir que estamos apenas perante mais um canal de expressão da vontade, de uma proposta, que o decisor tomará ou não livremente em conta. De resto, quanto aos planos de afetação, trata-se de um direito que em pouco se distingue da possibi- lidade que os próprios particulares possuem de apresentar propostas nesse âmbito. De facto, ao abrigo do disposto no artigo 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 38/2015, «os interessados na elaboração de um plano de afetação podem apresentar ao membro do Governo responsável pela área do mar proposta de contrato para ordenamento que tenha por objeto a elaboração de um plano de afetação». O plano de afetação que, even- tualmente, resultar desta iniciativa alterará o plano de situação respetivo (cfr. o artigo 19.º, n.º 2). Desta forma, há um claro desequilíbrio entre as posições do Estado e da Região no exercício de pode- res de gestão sobre o espaço marítimo adjacente ao arquipélago. Não se contesta que o princípio da gestão partilhada não impõe a codecisão nem exclui, sem mais, a possibilidade de, em certas áreas, se estabelecer meramente a audição de órgãos da Região, inclusivamente de forma não vinculativa. No quadro do Decreto- -Lei n.º 38/2015, todavia, esta reduzida possibilidade de influência estende-se a todas as matérias abrangidas pelos planos de situação e de afetação, não havendo nenhuma em que se detete a garantia de influência na decisão final. Há, assim, uma clara subalternização do papel da Região na gestão de um espaço marítimo que, no que concerne ao mar territorial e à plataforma continental, não deixa de ser território regional (cfr. o n.º 2 do artigo 2.º do EPARAA), ainda que não de domínio regional. Não contraria este juízo global a circunstância de os poderes de atribuição de títulos de utilização pri- vativa pertencerem, em exclusivo, à Região. Com efeito, estes poderes, além de em parte já estarem previstos no artigo 8.º, n.º 2, do EPARAA e, por isso, não constituírem uma concretização do princípio da gestão partilhada, são condicionados de forma muito relevante pelo disposto nos planos de situação e afetação, sempre aprovados pelo Governo. Trata-se, pois, de uma competência fortemente vinculada a um regime de enquadramento em cuja definição a Região não tem participação determinante. De todo o exposto resulta que os poderes conferidos pelas normas impugnadas aos órgãos regionais, no que diz respeito à dimensão essencial da gestão que é a elaboração e aprovação de planos de ordenamento – poderes de audição, de elaboração de propostas e de integração na comissão consultiva que elabora o parecer final – são poderes cuja natureza e alcance permitem apenas estabelecer “fluxos de comunicação e manifestação de vontade” por parte desses órgãos, mas não dão qualquer garantia de que essa vontade seja minimamente tida em conta ou respeitada na decisão final.  Satisfarão o direito das regiões autónomas de “participar na definição das políticas respeitantes às águas territoriais, à zona económica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos”, previsto na alínea s) do n.º 1 do artigo 227.º da CRP. Mas esse é um direito genérico, respeitante a todas as zonas marítimas, tendo por fun- damento o contributo decisivo dos arquipélagos da Madeira e dos Açores para a extensão da jurisdição marí- tima portuguesa e a importância do mar para as vidas das populações e para a economia desses territórios.

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