TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

76 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como se vê, a intervenção procedimental dos órgãos do governo próprio das regiões autónomas é par- ticularmente intensa, ao ponto de serem eles mesmos a elaborar os planos de ordenamento. Neste caso, na qualidade de entidade pública responsável pela elaboração dos planos, detêm poderes de direção e instrução que possibilitam a integração dos interesses regionais na resolução final dos procedimentos de planeamento. Compete-lhes identificar, distribuir e afetar os usos e atividades existentes (e potenciais) nas zonas marítimas adjacentes ao respetivo arquipélago, representando-os em mapas geo-espaciais; cabe-lhes ponderar o parecer final da comissão consultiva, assim como as objeções que não tenham sido ultrapassadas na reunião de con- certação, fundamentando o eventual não acolhimento das recomendações (artigo 16.º, n.º 2); e incumbe- -lhes ainda dirimir os conflitos de usos e atividades com base em critérios de preferência avaliados de acordo com parâmetros económicos e sociais que interessam às regiões autónomas (artigo 27.º, n.º 2). Verifica-se, pois, que nesta forma de participação a administração regional age não apenas como simples interessada, mas sobretudo como entidade responsável pela condução e gestão do procedimento, com objetivos, programas e interesses próprios a realizar, dando assim expressão às necessidades concretas das suas populações. Mas também, nos casos em que a entidade responsável pela elaboração dos planos não é um organismo ou serviço regional, a participação da administração regional permite a integração efetiva dos interesses regionais na versão final dos planos. Com efeito, no esquema apresentado pelo Decreto-Lei n.º 38/2015, a intervenção dos órgãos regionais no procedimento de formação dos planos não se reduz à mera auscul- tação – participação consultiva –, envolvendo também um acompanhamento contínuo do procedimento, num diálogo que possibilita encontrar consensos e soluções de compromisso capazes de satisfazerem os interesses específicos das regiões autónomas. As Regiões estão representadas numa «comissão consultiva» a quem compete apoiar e acompanhar a elaboração dos planos, assegurando a sua eficácia, e promover «uma adequada concertação de interesses» (artigo 14.º, n.º 1). Se no âmbito dessa comissão não for possível chegar a um consenso, a entidade responsável pela elaboração do plano promove a realização de uma «reunião de concertação», com vista a ultrapassar as objeções formuladas às propostas dos planos (artigo 16.º, n.º 1). Significa isso que, no domínio da «concertação», os órgãos da administração regional podem negociar ou ajustar compromissos de ordenamento do espaço marítimo que devam ser considerados na resolução final do procedimento. E, sendo assim, o resultado alcançado em sede de concertação, e formalizado nos planos, não deixa de exprimir uma atuação conjunta que associa a administração regional ao exercício da função pública visada pelo ordenamento. Esta fórmula participativa e de atuação concertada constituem uma técnica adequada a densificar o conceito de gestão partilhada. A função que é cometida à comissão consultiva, de representação dos vários interesses e de concertação ou composição dos interesses em conflito, leva à convicção de que os seus pare- ceres, ainda que não vinculativos, e os consensos obtidos devem ser respeitados e só podem ser contrariados pela sobreposição de interesses coletivos mais relevantes e ponderosos, tornados claros nos fundamentos da decisão (artigo 16.º, n.º 2). Em bom rigor, não se pode dizer que a intervenção da comissão consultiva é meramente instrumental, auxiliar ou informativa, que não contribui para própria formação da vontade do órgão decisor. No contexto organizativo e procedimental em que se insere, a manifestação de vontade dos representantes dos organismos que a compõem, sobretudo quando fundada em consenso, não pode deixar de ser valorizada e respeitada na resolução final, sob pena de se comprometer a finalidade das reuniões de concertação. Não é, porém, nesse sentido que o requerente interpreta o conceito de gestão partilhada. No seu enten- dimento, só há verdadeira «gestão partilhada» quando a vontade dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas tiver um peso específico na decisão do procedimento que aprova a versão final dos planos de situação e de afetação. Embora não faça referência às possíveis formas de participação nessa decisão, dá a entender que apenas a codecisão torna possível a distribuição do poder de decidir aqueles procedimentos. Nesta hipótese, é necessário o assentimento daqueles órgãos regionais para que os planos entrem em vigor.

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