TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

71 acórdão n.º 136/16 Ora, o artigo 1.º, n.º 3, da LBPOGEMN parece afastar completamente estas matérias do seu âmbito de aplicação, ao prever que, «sem prejuízo do disposto no número seguinte, a presente lei não se aplica a atividades que, pela sua natureza e atendendo ao seu objeto, visem exclusivamente a defesa nacional ou a segurança interna do Estado português». Mas isso não significa que os diversos planos de ordenamento marítimo não tenham e não devam considerar e salvaguardar esses interesses nacionais, nomeadamente quando incidem sobre áreas marítimas delimitadas: no artigo 10.º, n.º 1, alínea e) , do Decreto-Lei n.º 38/2015, relativo ao conteúdo material do plano de situação, estabelece-se que ele deve conter a «identificação das redes de estruturas e infraestruturas e dos sistemas indispensáveis à defesa nacional, à segurança interna e à proteção civil, sempre que não haja prejuízo para os interesses do Estado»; e no n.º 2 do artigo 25.º do RJIGT, determina-se que as regras e as diretrizes dos programas sectoriais e especiais, as quais podem respeitar aos domínios da defesa e segurança ou à salvaguarda de objetivos de interesse nacional, devem ser integradas nos instrumentos de ordenamento do espaço marítimo. Nestes casos, ainda que se trate meramente de identificar ou integrar programas de defesa e segurança nacional, esta competência deverá pertencer em exclusivo ao Estado, não podendo ser partilhada com a Região Autónoma dos Açores. Decerto que muitas das competências manifestadas nos planos de situação e de afetação, não se pren- dem com as funções de soberania assinaladas, nem envolvem, na sua essência, questões do domínio público marítimo. Tais instrumentos visam proceder à distribuição, pelas diversas áreas e volumes do espaço marí- timo nacional, de usos e atividades, atuais ou potenciais, a exercer por entidades públicas ou privadas, iden- tificando, em primeira linha, os condicionamentos a essa distribuição (artigo 7.º da LBPOGEMN). Sob o ponto de vista do ordenamento do espaço marítimo nacional, os planos procedem à inventariação da reali- dade existente, descrevendo o espaço tendo em conta os diversos limites que devem ser observados, como, por exemplo, os ambientais ou de defesa nacional e segurança interna, e depois, em função desses limites, efetuam a distribuição espacial de usos e atividades. Ora, dada a natureza tridimensional do espaço marítimo (fundos marinhos, coluna de água e superfície) e a multiplicidade de utilidades suscetíveis de serem proporcionadas por ele, a planificação e o plano convo- cam a intervenção de competências que não pertencem necessariamente ao universo dos direitos dominiais. De facto, os elementos que fazem parte do conteúdo material e documental dos planos, que vêm referidos nos artigos 10.º, 11.º, 20,º e 21.º do Decreto-Lei n.º 38/2015, evidenciam uma interligação e dependência recíproca com bens materialmente distintos dos que consubstanciam os direitos dominiais, como é o caso da proteção ambiental. Isto mostra claramente que os poderes de ordenamento do território marítimo estão ligados à confor- mação das utilidades públicas prosseguidas pelos bens em causa. O poder de afetar uma área à prática de atividades desportivas em detrimento, por exemplo, da investigação científica mais não é do que o poder de optar pela prossecução de uma utilidade pública em detrimento de outra. Assim sendo, então, a questão decisiva consiste em saber se as decisões finais quanto à “pré-definição” das utilidades fruíveis podem ficar, em exclusivo, reservadas ao Estado ou se à Região, no quadro da gestão partilhada da zona marítima adja- cente ao seu território, deve ser assegurada uma intervenção qualificada também nessa fase deliberativa da atividade planificadora. 9.3. Para isso, temos de começar por saber se o poder de ordenar o espaço marítimo é um tipo de poder que se integra no âmbito dos “poderes de gestão” sujeitos ao exercício conjunto ou partilhado, por força do disposto nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA. Antes de mais, cumpre referir que não é pela significação semântica das expressões «ordenamento» e «gestão» que é possível determinar objetivamente se a ação de planificar e de ordenar também denota uma atividade de gestão: se, por um lado, ordenar tem latente uma certa ideia de gestão, por outro, a gestão signi- fica execução ou concretização do que já está ordenado. De modo que não é pelo conteúdo dessas expressões

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=