TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
70 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Em suma: não se afigura que o regime questionado, de articulação dos planos de ordenamento marítimo e de planos territoriais, configure uma compressão ilegítima da competência legislativa da Região Autónoma dos Açores, em violação dos artigos 227.º, n.º 1, alínea a) , e 228.º, n.º 1, da CRP. 9.1. O requerente também questiona a legalidade das normas dos artigos 12.º, 18.º, 22.º, 26.º e 35.º do Decreto-Lei n.º 38/2015, que versam, como vimos, sobre a competência para a elaboração e aprovação dos planos de situação e afetação – os instrumentos de ordenamento do espaço marítimo previstos no Decreto- -Lei n.º 38/2015. Alega que a adoção da LBPOGEMN, a que se submete aquele diploma, tem em vista «assegurar a utili- zação sustentável de todo o espaço marítimo nacional», o que «em nada contende com questões de dominia- lidade pública ou de exercício de soberania nacional, mas antes com o exercício de funções administrativas», pelo que os poderes de gestão respetivos deveriam ser exercidos em conjunto ou no quadro de uma gestão partilhada. Deste modo, as normas em apreciação, ao reduzirem «o papel da Região Autónoma a um direito não qualificado de consulta, ou a um direito de elaboração (mas não de aprovação) de um plano de situação ou de afetação dos espaços marítimos adjacentes até às 200 milhas marítimas», violam o disposto nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA. Por sua vez, o autor das normas, vem afirmar que cabem ao Estado «os poderes essenciais à titularidade do domínio público marítimo (delimitação, defesa, manutenção das utilidades públicas)»; e que os pode- res de ordenamento do território marítimo, «estão indissociavelmente ligados à conformação da utilidade pública (ou utilidades públicas) prosseguida pelo bem, pelo que não são poderes meramente instrumentais ou de mera gestão, mas antes poderes principais que expressam opções básicas e essenciais para a vida da comunidade»; por isso, «os poderes de decisão quanto ao ordenamento, programação e planeamento das utilidades públicas associadas ao espaço marítimo nacional constituem poderes primários indispensáveis à garantia da subsistência do domínio, razão pela qual não podem ser transmitidos a órgãos de qualquer outra pessoa coletiva pública, para além do Estado»; além do mais, «os poderes de gestão incindíveis do exercício de poderes primários não podem também ser transmitidos a terceiros, já que uns dependem dos outros». De onde se segue que o ponto central da sua argumentação assenta na atribuição de distinta natureza aos poderes de ordenamento e aos poderes de administração ou gestão dos bens e suas utilidades. Só estes podem caber às entidades regionais, pois os primeiros são essenciais “para salvaguardar a dominialidade do espaço marítimo nacional e, consequentemente, a sua titularidade pelo Estado”. Justificar-se-ia, assim, plenamente, que os poderes de decisão quanto ao ordenamento estejam reservados aos órgãos do Estado, admitindo-se apenas que as regiões autónomas possam exercer poderes de iniciativa e de elaboração dos respetivos planos. Vejamos, então, se o poder de ordenar o espaço marinho envolve questões de domínio público marinho incluídas no âmbito da gestão conjunta ou da gestão partilhada estabelecida nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º da EPARAA. 9.2. É inequívoco que a Região Autónoma dos Açores só pode exercer sobre as zonas do espaço marítimo nacional adjacente ao seu território os poderes que forem compatíveis com a integração dos bens em causa no domínio público marítimo do Estado e não respeitarem à integridade e soberania do Estado (n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA) – em suma, os poderes que não constituam uma competência exclusiva do Estado. Como já dissemos, no âmbito do domínio público marítimo, não podem deixar de ser exercidos pelo Estado os poderes cuja transferência frustraria a finalidade que justifica a dominialização do bem e a sua atri- buição ao Estado. Cabem neste âmbito, designadamente, os poderes de manutenção, delimitação e defesa do domínio. O parâmetro assim fixado admite, pelo menos em termos estritamente literais, diversas interpre- tações, que lhe atribuem uma abrangência maior ou menor. No seu núcleo, contudo, encontram-se alguns poderes que incontestavelmente pertencem à competência exclusiva do Estado, como é o caso da defesa nacional e da segurança interna, funções que se prendem com a soberania.
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