TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
69 acórdão n.º 136/16 menos indiretamente – é que, ainda que nem todos os planos sejam aprovados por decreto legislativo regio- nal, são, pelo menos, aprovados ao abrigo do disposto num decreto legislativo regional. Todavia, do ponto de vista dos efeitos jurídicos contidos nas normas impugnadas, o resultado não é esse. No n.º 3 do artigo 5.º apenas se estabelece que os planos de ordenamento marítimo devem identificar expressamente as normas dos programas e planos territoriais que, por incompatibilidade, devem ser revoga- das ou alteradas; e no n.º 5 do artigo 24.º impõe-se o dever de fundamentar o não acolhimento dos pareceres das entidades que elaboraram os planos territoriais, no caso de não se ter obtido uma solução concertada que ultrapassasse as divergências existentes. Ora, o facto de os planos marítimos terem de identificar e fun- damentar as normas dos planos territoriais que são incompatíveis com os usos e atividades neles previstos, sob pena de nulidade, não tem como consequência jurídica direta a extinção ou a modificação das normas territoriais incompatíveis. Só as entidades com poder para aprovar os planos territoriais podem revogar ou alterar as normas em colisão com os planos de situação ou de afetação e, portanto, nem há invasão da esfera de competência dessas entidades, nem se preveem consequências em caso de subsistência, por não revogação ou alteração, das normas incompatíveis ou desconformes. Por conseguinte, o sentido normativo daqueles preceitos é o de resolver antinomias de normas de diferentes espécies de planos e não o de se sobrepor à com- petência normativa das entidades que aprovam os planos territoriais. O conflito de normas é resolvido com base num critério de articulação de planos, que se caracteriza «pela obrigação de compatibilização recíproca entre planos, a qual se traduz na proibição de coexistência de planos que contenham disposições contraditórias» (Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urba- nismo, Almedina, Vol. I, 2.ª edição, p. 365). De facto, as medidas previstas no Decreto-Lei n.º 38/2015 têm o seu simétrico reflexo no Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, que procede à revisão do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT). Assim, após se preceituar, no n.º 3 do artigo 25.º deste diploma, que «os programas e os planos territoriais devem assegurar a respetiva compatibilidade com os instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional, sempre que incidam sobre a mesma área», prevê-se no n.º 4 que «os programas e os planos territoriais avaliam e ponderam as regras dos instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional preexistentes, identificando expressamente as normas incom- patíveis que devem ser revogadas ou alteradas»; e para assegurar esta compatibilização, preveem-se diversos mecanismos de concertação para a fase de elaboração dos programas e planos territoriais (artigo 49.º); por sua vez, por força do disposto no artigo 129.º, n.º 2, «são, ainda, nulos os programas e os planos territoriais aprovados em violação de instrumentos de ordenamento do espaço marítimo, sempre que não tenham sido previstas as necessárias medidas de compatibilização, de acordo com o disposto no artigo 25.º». Significa isto que, se os planos territoriais preexistentes poderão ter que ser revogados ou alterados por força da sua incompatibilidade com os planos de ordenamento marítimo a aprovar ao abrigo do Decreto- -Lei n.º 38/2015, a inversa também é verdadeira, estando previsto que futuros planos territoriais, aprovados posteriormente aos de ordenamento marítimo, tenham idêntica repercussão sobre a vigência destes. As solu- ções previstas no Decreto-Lei n.º 38/2015 deverão, portanto, ser compreendidas à luz deste equilíbrio, de procurar um dinâmico ajustamento recíproco dos dois tipos de planos. É em atenção a esta regulação global que se pode concluir que o legislador não pretendeu estabelecer nenhuma prevalência, em geral, dos instru- mentos de ordenamento do espaço marítimo nacional sobre os programas e planos territoriais, mas apenas estabelecer um critério temporal de compatibilização de planos. Na falta de um critério imposto diretamente pela Constituição, o legislador da República deverá estabe- lecer mecanismos que permitam a articulação entre competências que possam entrar em conflito – e só ele o poderá fazer, uma vez que não estamos no âmbito de uma competência legislativa concorrente do Estado e das regiões. Foi o que fez, não só quanto à articulação e compatibilização de planos territoriais com os instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional (artigo 25.º), como quanto à relação entre os programas territoriais de âmbito nacional e regional (artigo 26.º) – onde, aliás, adotou o mesmo critério de “um compromisso recíproco de compatibilização das respetivas opções”.
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