TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
65 acórdão n.º 136/16 sujeita a competência legislativa regional, tem um duplo sentido: «sem prejuízo de esta expressão ter antes de mais um sentido geográfico, traçando os limites espaciais de vigência dos decretos legislativos regionais, ela tem também forçosamente um sentido institucional, que impede os Parlamentos insulares de emanar legislação destinada a produzir efeitos relativamente a outras pessoas coletivas públicas que se encontram fora do âmbito de jurisdição natural das Regiões Autónomas» (Acórdãos n. os 258/07, 402/08, 304/11 e 793/13). Ora, a concretização do disposto nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA envolve a repartição de com- petências entre órgãos da República e da Região, e consequentemente, produz efeitos em relação a pessoas coletivas públicas – neste caso, o próprio Estado – que se encontram fora da jurisdição natural da Região Autónoma dos Açores. Por isso, deverá ser efetuada pelos órgãos da República e não pelos da Região, como se decidiu no Acórdão n.º 315/14: «A Região Autónoma dos Açores não pode unilateralmente definir os termos da gestão partilhada do domínio público marítimo, justamente porque a regulação primária dessa matéria contenderia com as competências das autoridades nacionais. O parâmetro do “âmbito regional” [alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da CRP], na sua componente institucional, impede que os parlamentos insulares produzam legislação destinada a produzir efeitos relativamente a pessoas coletivas que se encontram fora do âmbito de jurisdição natural das Regiões Autónomas, como é o caso do próprio Estado». É de notar que a densificação do modelo de repartição de competências previsto nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA tanto pode ser efetuada pelo Governo como pela Assembleia da República, já que não inte- gra, mesmo no que respeita às zonas marítimas que pertencem ao domínio público do Estado, o âmbito da reserva de competência relativa do último órgão. É verdade que, de acordo com o disposto no artigo 165.º, n.º 1, alínea v) , da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo, legislar sobre a «definição e regime dos bens do domínio público». Contudo, o artigo 84.º, n.º 2, da Lei Fundamental dispõe que a lei, além do “regime”, define as “condições de utilização e limites” destes bens. Assim, como este Tribunal reconheceu no Acórdão n.º 402/08 (superando a posição inicial, mais restri- tiva, assumida nos Acórdãos n. os 330/99 e 131/03), estão excluídas do âmbito da reserva relativa de compe- tência as dimensões constantes da parte final do n.º 2 do artigo 84.º – as “condições de utilização e limites”. O Tribunal baseou tal posição sobretudo em elementos históricos e sistemáticos, numa argumentação que se mantém válida: o legislador constitucional de 1989, ao introduzir o artigo 84.º, não se limitou a reproduzir os termos que constam no artigo 165.º, n.º 1, alínea v) – a “definição” e o “regime”. Além desses, referenciou no artigo 84.º, n.º 2, precisamente “as condições de utilização” e “limites”. Tal opção só tem sentido se estas duas categorias não estiverem já contidas no termo “regime”. Não o estando, deverá considerar-se que as matérias a que se referem não se encontram abrangidas pelo artigo 165.º, n.º 1, alínea v) . Ora, a concretização do modelo previsto no n.º 1 do artigo 8.º do EPARAA diz respeito à repartição de poderes gestionários cujo exercício conjunto pelo Estado e pela Região previamente se estabeleceu serem compatíveis com o regime dos bens do domínio público do Estado. Tem a ver, assim, com as “condições de utilização” das zonas marítimas em causa, pelo que essa regulação não pertence ao âmbito da reserva relativa de competência da Assembleia da República. Estando delineado o enquadramento constitucional e estatutário nesta matéria, importa agora con- frontá-lo com as normas impugnadas. 8.1. O requerente começa por invocar a inconstitucionalidade das normas de dois grupos de preceitos do Decreto-Lei n.º 38/2015, de 12 de março: (i) as normas dos artigos 12.º, 18.º, 22.º, 24.º, n.º 5, e 26.º; (ii) as normas dos artigos 5.º, n.º 3, e 24.º, n.º 5. Alega que as normas de cada um desses grupos “compri- mem a competência normativa regional à margem do texto constitucional”, sendo por isso inconstitucionais, por violação do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º e no n.º 1 do artigo 228.º da CRP. O primeiro grupo de normas regula os atos que compõem os procedimentos de elaboração dos planos de situação e de afetação dos espaços marítimos. Em ambos os procedimentos, aquelas normas atribuem ao membro do Governo responsável pela área do mar a competência para praticar o ato inicial do procedimento e ao Conselho de Ministros a competência para tomar a decisão final, na forma de resolução; e preveem a
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