TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

64 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 7.2. Não parece haver qualquer diferença gradativa, em termos literais, entre a gestão partilhada, prevista no n.º 3, e a efetuada em conjunto, prevista no n.º 1. Afinal, o que é efetuado em conjunto é partilhado, e vice-versa. Os restantes elementos da interpretação não sugerem igualmente nenhuma diferença de conteúdo entre as duas expressões. A existência de duas normas nesta matéria parece explicar-se pela circunstância dos poderes sobre as zonas marítimas respetivas não serem completamente coincidentes. Como já se referiu, de acordo com o disposto na CNUDM, são distintos os poderes reconhecidos ao Estado português sobre o mar territorial (artigo 2.º), a zona económica exclusiva (artigo 56.º) e a plataforma continental (artigo 77.º). Parece ser, aliás, por esta razão que a plataforma continental, um bem do domínio público estadual ex cons- titutione, não é abrangida pelo n.º 1 do artigo 8.º do EPARAA. Ainda assim, na medida em que a sua per- tença àquele elenco é imposta pela própria Constituição, sempre se dirá que o exercício, por entidades não estaduais, de poderes relativos à plataforma continental está sujeito à condição de que esses poderes «sejam compatíveis com a integração dos bens em causa no domínio público marítimo do Estado». Em consonância, o n.º 3 refere-se aos «demais poderes reconhecidos ao Estado Português» e sujeita a sua partilha apenas ao limite da «integridade e soberania do Estado». A atribuição do exercício de certos poderes em exclusivo ao Estado, em detrimento da Região, está, como é natural, sujeita à condição prévia de esses poderes lhe serem reconhecidos internacionalmente. De contrário, a questão da repartição interna de com- petências nem se chegaria a colocar. Assim, será, em primeira linha, por a existência de diferenças no âmbito dos poderes reconhecidos ao Estado português poder implicar diferenças no âmbito da reserva exclusiva de competências do Estado que, nesta matéria, se preveem duas normas e não apenas uma. Em qualquer caso, ainda que não se possa arredar completamente a existência de uma ténue nuance distintiva entre o “exercício conjunto” e a “gestão partilhada”, os dois conceitos sempre terão um conteúdo muito semelhante. Como se pode ler no já referido Acórdão n.º 315/14: «[O]s poderes de gestão são atribuídos à Região para um exercício conjunto, no quadro de uma gestão parti- lhada, o que convoca a existência de estruturas organizatório-funcionais e procedimentais que tornem possível a participação e a obtenção do acordo dos vários órgãos competentes. Não se afigura simples a delimitação dos conceitos de exercício conjunto e de gestão partilhada. Ambos têm em comum o facto de dois ou mais órgãos administrativos, uns da República e outros da Região, terem poderes para gerir as zonas marítimas adjacentes aos Açores: a prática de atos de gestão dessas zonas é, pois, comum a vários órgãos habilitados a dispor sobre a matéria em causa. Mas os meios para a participação e manifestação da vontade dos vários órgãos competentes na gestão das zonas marítimas não são uniformes, pois podem cobrir práticas muito diversificadas que vão da simples consulta à codecisão». “Exercício conjunto” e “gestão partilhada” são assim conceitos indeterminados, com um alto grau de elastici- dade, que não permitem uma plena vinculação. Por isso, na medida dessa indeterminação, admitem formas variá- veis de cooperação gestionária entre os órgãos da República e os da Região. Assim se reconhece expressamente no Acórdão n.º 315/14: «a comparticipação no exercício da atividade administrativa de uns e de outros órgãos pode assumir diversas formas, desde a criação de instituições de “concertação” entre diversas unidades administrativas, até à previsão de mecanismos procedimentais de consulta, propostas, pareceres, autorizações, aprovações, homo- logações, informações, etc.». Como o artigo 8.º do EPARAA não densifica o princípio da gestão conjunta ou partilhada, nem dá indi- cações sobre o respetivo modus faciendi , é necessário determinar um conteúdo prescritivo que permita uma aplicação vinculada. É o que se refere no Acórdão n.º 315/14: «num domínio em que existem atribuições de exercício comum e repartido tem que haver uma definição prévia daquilo que pode ou não ser partilhado, assim como dos termos concretos em que se processa a partilha». Nos termos do disposto nos artigos 227.º, n.º 1, alínea a) , e 112.º, n.º 4, da Constituição, tal tarefa incumbe ao legislador da República. E assim é, porque o requisito do “âmbito regional”, a que se encontra

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