TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
572 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL é justamente prevenir uma utilização abusiva de determinadas despesas e distribuição de dividendos e em fraude às normas que visam atingir o rendimento real dos sujeitos passivos. III. É justamente a sua função antiabuso que legitima as tributações autónomas à luz do princípio da capacidade contributiva, da igualdade e da proporcionalidade. IV. No caso concreto, a norma em questão, cuja ilegalidade a recorrente sindica, é a do artigo 88.º, n.º 13 do CIRC, sendo que tal norma pode ser considerada como de um combate específico a comportamentos consi- derados de risco ou potencialmente suspeitos, – a atribuição de bónus e outras remunerações variáveis excessi- vamente elevados e bem assim de indemnizações pagas pela cessação de funções – a tentativa de remediar uma falha criada e existente no sistema que, por isso, surge no horizonte (e na redação) das tributações autónomas. V. Claramente, o objetivo do legislador esteve em desencorajar as sociedades dos variados setores em remunerar, excessivamente, os seus órgãos sociais, especificamente durante um período de franca carência, de agravamen- to de dívida pública e de recessão económica, exaurindo com isso os ativos societários. VI. Para além do desencorajamento, na base da tributação que se discute, estiveram razões atinentes a uma mais justa repartição de encargos tributários e de moralização progressiva de políticas remuneratórias das empresas. VII. Deste modo, não se limitando a tributação autónoma ao fim clássico a que, por regra, se propõem os impos- tos – à obtenção de meios destinados à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas –, mas também prosseguindo objetivos extrafiscais, como sejam a redistribuição equitativa da rique- za e a justa repartição dos encargos. VIII. Assim, não se está perante uma tributação discriminatória, um imposto de ciasse, que afronte os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da tributação sobre o rendimento real. IX. Nos termos do artigo 104.º, n.º 1, al. b) do CIRC, é aos sujeitos passivos pessoas coletivas – e não às pessoas singulares – quem cabe pagar o imposto, que resultará do apuramento, preenchimento e apresentação da declaração de rendimentos. X. Ou seja, é sobre as pessoas coletivas (e não sobre os trabalhadores) que recai a obrigação do pagamento do imposto, sendo que é sobre elas que recai a norma de incidência prevista no artigo 88.º do CIRC e não sobre os trabalhadores. XI. É, por isso, falaciosa a primeira questão sugerida pela recorrente, dado que as tributações autónomas tributam despesas, com base no pressuposto de que as mesmas servem para pagar (camufladamente) a terceiros rendi- mentos que pela sua natureza seriam tributados e/ou, bem assim, servem como instrumento para repor uma maior justiça fiscal, uma maior igualdade na repartição dos encargos fiscais e um maior respeito pelo princípio da capacidade contributiva. XII. Foi exatamente com o objetivo de preservar uma justa repartição dos encargos fiscais e de promover um equilibrado sacrifício no pagamento de impostos, a suportar pelo universo de contribuintes, que a lei fixou a tributação, na esfera das empresas, da atribuição de prémios e bónus acima do valor legalmente estipulado. XIII.Quanto à segunda questão abordada, a da aplicabilidade da tributação autónoma sobre a totalidade dos encargos com bónus de administradores, gerentes ou gestores só dever ser feito sobre o que exceder do valor previsto no artigo 88.º, n.º 13, alínea b) do CIRC – isto é, a incidência deve ser apenas sobre o que exceder 25% e € 27 500 das remunerações anuais de cada um dos administradores –, entende a recorrida também não assistir razão à recorrente. XIV. Salvo o devido respeito, da leitura do artigo 88.º, n.º 13, al. b) do CIRC não se retira o entendimento perfi- lhado pela recorrente. O que se retira é que para que se tribute autonomamente bónus ou outras remunera- ções variáveis pagas a membros dos órgãos sociais, os quantitativos ultrapassem uma parcela superior a 25% da remuneração anual auferida e possuam valor superior a € 27 500. XV. Caso o legislador (e a lei) tivessem pretendido que a tributação incidisse somente sobre o excesso do valor de € 27 500 ou do limite de 25% da remuneração anual, tê-lo-iam refletido na redação da norma legal, o que, manifestamente, não aconteceu.
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