TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
571 acórdão n.º 197/16 constitucionais, é a que tratasse de impor a recuperação junto dos próprios administradores (autores da gestão enganosa) da remuneração variável em causa; e é excessiva porque se a preocupação primacial for realmente a indicada (por oposição a obter receita) não se percebe por que razão não se prevê a devolução do imposto caso no final dos três anos referidos na alínea b) do n.º 13 do artigo 88.º do CIRC se confirme o desempenho positivo da sociedade a que a norma alude. Donde a inconstitucionalidade também por mais esta razão: na medida em que a norma não prevê o reembolso da tributação autónoma caso no final do período de três anos que acolhe se confirme o desempenho positivo da empresa. E) Não é constitucionalmente admissível, por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, sujeitar ao castigo da tributação autónoma prevista na alínea b) do n.º 13 do artigo 88.º do CIRC, também a parte da remuneração variável que se contenha alternativamente dentro de um dos dois limites excludentes dessa tributação (valor absoluto igual ou inferior a € 27 500, ou valor relativo igual ou inferior a 25% da remuneração anual do administrador). Para além do mais, é de realçar que o princípio da proporcionalidade diz-nos que a medida (no caso, que atinge o património/propriedade da empresa) não deve ir além do neces- sário. Ora, é desnecessário para combater fiscalmente o alegado excesso remuneratório legalmente balizado por referência àquelas duas fasquias, tributar também a parte do todo que nelas se contém. F) A norma que exige imposto adicional a quem apresente prejuízos fiscais, do n.º 14 do artigo 88.º do CIRC, colide frontalmente com os princípios constitucionais da igualdade, da capacidade contributiva e do rendi- mento real (é a antítese deles). G) Mesmo que se veja na referida norma um objetivo primacialmente extrafiscal (desincentivar remunerações variáveis a gestores, encargos com frota automóvel, etc.), e se lhe reconheça e ao meio usado para o servir, legitimidade constitucional para atingir o património e gestão privadas, não é ainda assim constitucional- mente admissível que a norma do n.º 14 do artigo 88.º do CIRC, imponha um agravamento em dez pontos percentuais de todas as tributações autónomas sobre despesas e encargos (incluindo atribuição de bónus) pelo simples facto de a sociedade incorrer em prejuízos fiscais, mesmo que (na interpretação que se contestou sem sucesso) se prove que o apuramento de prejuízos fiscais é uma mera consequência técnica de algumas normas fiscais, não refletindo prejuízo económico, prejuízo real, de espécie alguma. H) São violadas pelas referidas normas e pelas referidas razões, os seguintes artigos e princípios constitucio- nais: 2.º (Estado de direito democrático, com os inerentes princípios da proporcionalidade e da igualdade), 13.º princípio da igualdade), 18.º, n. os 2 e 3 (princípio da proporcionalidade), 62.º (direito de propriedade privada), 80.º, alínea c) (liberdade de iniciativa e de organização empresarial), 81.º, alínea f ) (liberdade de gestão empresarial, que tem por contraponto um Estado que promove a neutralidade por oposição a criar distorções), 82.º, n. os 1 e 3 (garantia de existência do setor privado) e 86.º, n.º 2 (proibição de intervenção por parte do Estado na gestão das empresas privadas), 103.º, n.º 1 e 104.º, n.º 2 (princípio da tributação, fundamentalmente, do rendimento real e, em conjugação com o princípio da igualdade, princípio da capaci- dade contributiva), todos da Constituição da República Portuguesa. A Autoridade Tributária e Aduaneira, na qualidade de recorrida, contra-alegou, concluindo do seguinte modo: «I. Desde logo se diga que a razão de ser das tributações autónomas se fixa no desincentivo do tipo de despesas que tributam, as quais, pela sua natureza, são propiciadoras de pagamento de rendimentos camuflados, permitindo, em última análise, às empresas reaver (até) algum imposto que deixou de ser pago pelo bene- ficiário efetivo dos rendimentos, transferindo a responsabilidade deste para a esfera de quem paga esse rendimento. II. O que, só por si, lhes confere uma clara natureza antiabuso, manifestamente acessória/complementar à tribu- tação segundo a capacidade contributiva revelada pelo rendimento, ainda que só aparentemente em prejuízo da tributação do rendimento real (leia-se, com base na contabilidade), porquanto o que com elas se pretende
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