TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
565 acórdão n.º 195/16 No caso, constata-se que, anteriormente à entrada em vigor do RJUE, não existia qualquer preceito que regulasse a possibilidade e os termos da restrição a operar no direito à inviolabilidade do domicílio, por força da atividade inspetiva em análise. O que exclui a possibilidade de ter existido uma autorização constante de diploma parlamentar que previamente houvesse habilitado uma tal norma anterior que fosse, agora, mera- mente repetida no preceito que a suporta (o artigo 95.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 555/99). Conclui-se, por isso, que a norma, cuja constitucionalidade se sindica, é inovatória, carecendo, por isso, de específica credencial parlamentar, que não foi concedida pela Lei n.º 110/99, de 3 de agosto, quanto à admissibilidade de restrição ao direito à inviolabilidade do domicílio. Resta saber se se verificara, à data de aplicação da norma, uma sanação do vício de inconstituciona- lidade, por força de lei posterior da Assembleia da República, que especificamente reiterasse e fizesse sua norma de conteúdo idêntico à da norma apreciada. Quanto a este ponto, pronunciou-se o Acórdão n.º 145/09, mencionando o seguinte: «O artigo 95.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 555/99 não foi objeto de qualquer alteração ou reprodução por via de lei ou de decreto-lei autorizado, nem tão-pouco de qualquer proposta ou projeto de alteração que tivesse sido rejei- tado em sede parlamentar (os trabalhos preparatórios daqueles diplomas estão disponíveis em www.parlamento.pt ) , pelo que a norma em apreciação não foi assumida pela Assembleia da República. Por outro lado, a circunstância de o Decreto-Lei n.º 555/99 ter sido republicado em anexo à Lei n.º 60/2007 (cfr. artigo 4.º desta lei), não significa (…) que “o legislador parlamentar fez sua a norma posta em crise”. Neste sentido depõe a “natureza instrumental e não inovadora da republicação”, que apenas visa garantir, de forma fácil e segura, o conhecimento do direito em vigor [cfr. David Duarte/Sousa Pinheiro/Lopes Romão/Tiago Duarte, Legística – Perspetivas sobre a conceção e redação de atos normativos, Almedina, 2002, p. 196 e segs., e Blanco de Morais, Manual de Legística. Critérios Científicos e Técnicos para Legislar Melhor, Verbo, 2007, p. 557 e segs.]; bem como a própria Lei n.º 74/98, de 11 de novembro – Lei da publicação, identificação e formulário dos diplomas (republicada, em anexo, pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto) –, quando, no artigo 6.º, especifica os casos de republicação integral dos diplomas, em anexo.» O raciocínio exposto foi corroborado pelo Acórdão n.º 160/12, quanto à não sanação do vício de inconstitucionalidade orgânica, por força da republicação determinada pelo artigo 4.º da Lei n.º 60/2007, de 4 de setembro, nos seguintes termos: «Na verdade, a mera republicação de decreto-lei governamental, sem que seja acompanhada de alteração do(s) preceito(s) anteriormente ferido(s) de inconstitucionalidade orgânica, constitui um mero expediente de técnica legística, que visa facilitar a apreensão do conteúdo normativo dos atos legislativos, sem que signifique uma inte- gral novação de toda e cada uma das normas constantes do diploma republicado. Diferente seria, caso a Lei n.º 60/2007 tivesse procedido a uma revogação global do decreto-lei em causa, mediante aprovação de um novo texto normativo, ainda que este recuperasse uma parcela significativa das normas anteriormente vigentes. Não foi isso, porém, o que sucedeu.» Por tudo quanto fica exposto, conclui-se que a norma, extraída do artigo 95.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro (RJUE), na parte em que permite a realização de inspeções ao domicílio de qualquer pessoa, sem o seu consentimento, nos termos e para os efeitos do referido diploma, ainda que sem a dispensa de prévio mandado judicial, é organicamente inconstitucional, por violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa.
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