TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
543 acórdão n.º 193/16 A proteção da família encontra-se, na verdade, constitucionalmente prevista, tanto na sua vertente objetiva, enquanto instituição e elemento fundamental da sociedade (artigos 67.º e 68.º), como numa ver- tente subjetiva, perspetivada a partir dos seus membros (artigo 36.º). Tal proteção resulta também, no plano jurídico-internacional, de diversos instrumentos internacionais, aos quais o Estado Português se encontra vinculado (vide, além dos artigos 12.º e 16.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, por exem- plo: o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, artigos 17.º e 33.º; o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, artigos 10.º e 11.º; a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, artigo 8.º; ou a Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos da Criança). No plano da União Europeia, é de salientar o disposto nos artigos 7.º, 9.º, 14.º, 24.º (em especial o seu n.º 3, em que se garante a unidade familiar na vertente do direito à convivência) e 33.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [sobre tais preceitos vide os comentários em Alessandra Silveira e Mariana Canotilho (coord.), Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia Comentada , Almedina, Coimbra, 2013]. In casu os recorrentes invocam estar em causa a violação de direitos fundamentais seus e dos seus filhos, ora recorridos, uma vez que estes foram, contra a vontade dos primeiros, deles separados e confiados a uma instituição com vista a futura adoção. Os direitos em causa decorrem da proibição constitucional estatuída no artigo 36.º, n.º 6, nos termos da qual, os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. Cumpre sublinhar estes dois aspetos: o direito à convivência dos pais e dos filhos e o direito a uma defesa judicial desse direito à convivência, nomeadamente em relação ao imputado incumprimento de deveres fundamentais dos pais para com os filhos. 15. O direito à convivência entre os membros da família é uma projeção subjetiva da tutela da unidade da família, condição indispensável à realização pessoal dos seus membros: dos pais, como pais; dos filhos em relação aos pais, como filhos; e dos próprios filhos nas relações entre si, como irmãos. O papel específico do pai ou da mãe e dos filhos nas relações entre si e com os pais pressupõe, com efeito, a possibilidade de algum tipo de convivência. Um dos efeitos da medida de promoção e proteção que tem por objeto a confiança a pessoa selecionada para adoção ou a instituição com vista a futura adoção prevista no artigo 35.º, n.º 1, alínea g) , da LPCJP consiste precisamente em os pais ficarem inibidos do exercício das responsabilidades parentais em relação à criança confiada, deixando de poder conviver com ela e, inclusivamente, de a visitar ou estabelecer outros contactos; a medida em causa «dura até ser decretada a adoção e não está sujeita a revisão» (cfr. o artigo 1978.º-A do Código Civil e o artigo 62.º-A, n. os 1 e 2, da LPCJP, na redação da Lei n.º 31/2003, de 22 de agosto). Por isso, tal medida põe necessariamente em causa o direito fundamental dos pais conviverem com os seus filhos a quem a medida tenha sido aplicada, assim como o direito fundamental destes últimos con- viverem com os seus pais. Trata-se em ambos os casos de posições jurídicas subjetivas constitucionalmente protegidas enquanto direitos, liberdades e garantias. É esse, na verdade, o sentido da jurisprudência constitucional relativa à garantia consagrada no artigo 36.º, n.º 6, da Constituição: «Esta garantia, que consiste em os filhos não poderem, em princípio, ser separados dos pais, não constitui ape- nas um direito subjetivo dos próprios pais a não serem separados dos seus filhos, mas também um direito subjetivo dos filhos a não serem separados dos respetivos pais. Eventuais restrições aos mesmos direitos apenas serão possíveis mediante decisão judicial, nos casos especialmente previstos por lei e verificados os pressupostos expressamente previstos na Constituição: quando se torne necessário salvaguardar os direitos dos menores, por os pais não cum- prirem os seus deveres para com eles. Assim se pretende proteger a família, como o impõe o artigo 67.º, n.º 1, do texto constitucional. Esta proteção constitucional dada à família, bem como a concedida à paternidade e à maternidade, nos termos dos artigos 67.º e 68.º da Lei Fundamental, permite compreender a importância de que se reveste, na nossa ordem
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=