TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
542 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL decisão em primeira instância – 25 de maio de 2012 –, já era obrigatória a constituição de advogado ou a nomeação de patrono à criança ou jovem em determinadas circunstâncias, e, em qualquer caso, no debate judicial (vide o artigo 103.º, n. os 2 e 4, da LPCJP, na redação originária). Em terceiro lugar, importa ter presente a existência de uma relação de prejudicialidade entre as duas normas: só têm de ser os progenitores a elidir a presunção de que foram notificados para os efeitos previstos no artigo 114.º, n.º 4, da LPCJP, conforme previsto no artigo 254.º, n. os 3 e 4, do Código de Processo Civil então aplicável, ex vi artigo 255.º, n.º 1, do mesmo diploma, caso o seu patrocínio por advogado não seja obrigatório; sendo obrigatório tal patrocínio, o citado artigo 255.º não tem aplicação, uma vez que o mesmo disciplina precisamente as notificações às partes que não constituam mandatário. Deste modo, a eventual inconstitucionalidade da segunda norma sindicada implica a inaplicabilidade da primeira norma no caso sub iudicio , o que, a verificar-se, tornaria inútil um conhecimento autónomo da questão de inconstitucionalidade correspondente. Justifica-se, por isso, inverter a ordem de apreciação das duas normas em causa, começando por apreciar se a norma extraída do artigo 103.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, segundo a qual, em processo de promoção e proteção de crianças e jovens em que esteja em causa a aplicação de medida de confiança a pessoa selecionada para adoção ou a instituição com vista a futura adoção, não é obrigatória a constituição de advogado aos progenitores das crianças ou jovens em causa. No entender dos recorrentes, tal norma «viola o princípio da tutela jurisdicional efetiva, consagrad[o] no artigo 20.º da Constituição, ao negar a assistên- cia necessária e obrigatória dos progenitores por advogado em processo em que está em causa a restrição de direitos fundamentais» [cfr. a alínea h) do n.º 3 do requerimento de interposição de recurso, a fls. 1728]. E) Do mérito do recurso 14. A Constituição da República Portuguesa, ao considerar a família como elemento fundamental da sociedade, reconhece-lhe «direito à proteção da sociedade e do Estado e à efetivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros» (artigo 67.º, n.º 1). Por isso mesmo, «a insubstituível ação [dos pais e das mães] em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação» deve ser protegida, reconhecendo-se que «a maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes» (artigo 68.º, n. os 1 e 2). O desenvolvimento integral das crianças é igualmente objeto de deveres de proteção «contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições», assumindo o Estado o dever de assegurar «especial proteção às crianças […] por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal» (artigo 69.º, n. os 1 e 2). Ressalta desta valoriza- ção da família e dos laços de convivência dos seus membros uma justificação objetiva fundada em razões de ordem social e, simultaneamente, o reconhecimento da sua importância subjetiva, enquanto condição para o desenvolvimento da personalidade dos respetivos membros, pais e filhos. Daí constituir um corolário natural a tutela subjetiva dos membros da família, seja quanto à constituição desta, seja no respeitante à sua preservação (cfr. o artigo 36.º da Constituição). A complementaridade entre a dimensão objetiva e subjetiva da tutela constitucional da família e dos seus membros é reconhecida na jurisprudência constitucional, na doutrina e em múltiplas convenções inter- nacionais de que o Estado Português é parte. No Acórdão n.º 416/11, afirmou este Tribunal: «[S]em prejuízo de se extrair dos n.os 5 e 6 do artigo 36.º da Constituição uma proteção constitucional direta dos pais, surgindo estes como titulares de posições jurídicas subjetivas (v., quanto ao artigo 36.º, n.º 5, o acórdão n.º 174/93 e, quanto ao artigo 36.º, n.º 6, os acórdãos n. os 181/97, 470/99 e 232/04 […]), a proteção constitucional da família e da filiação caracteriza-se, essencialmente, por uma dimensão objetiva, consistente em preservar a unidade familiar e a relação entre pais e filhos, dela decorrendo, portanto, para o legislador ordinário, sob pena de deficit inconstitucional de proteção (ou de prestação normativa), um dever de legislar em ordem a essa proteção.»
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