TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
52 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ordenamento e gestão do espaço marítimo e (ii) a tramitação de procedimentos administrativos relativos aos usos e atividades a desenvolver nesse espaço. – No que respeita ao primeiro vetor (o ordenamento e gestão do espaço marítimo), a Lei n.º 17/2014 estabeleceu o primeiro entorse ao quadro de gestão conjunta ou partilhada definido nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA, ao atribuir ao Governo da República a competência exclusiva para a aprovação dos planos de situação e de afetação (cfr. n.º 2 do artigo 5.º e artigo 8.º). – Por seu turno, o Decreto-Lei n.º 38/2015 densifica, aparentemente, o modelo de gestão conjunta ou partilhada do espaço marítimo, o qual, grosso modo, se traduz na distinção entre duas compe- tências: (i) a competência de ordenamento do espaço marítimo, referente à adoção de planos de situação ou de afetação (atribuída em exclusivo ao Governo da República); e (ii) a competência para a emissão de títulos de utilização privativa do espaço marítimo (atribuída em exclusivo às Regiões Autónomas se a atividade se desenvolver no espaço marítimo adjacente ao respetivo arqui- pélago até ao limite das 200 milhas marítimas). – Porém, no modelo gizado pelo artigo 8.º do EPARAA, esta segunda competência (para a emissão de títulos de utilização privativa) era já exclusiva das Regiões Autónomas, ao passo que a primeira competência (para a adoção de instrumentos de gestão do espaço marítimo adjacente) deveria ter sido sujeita a um modelo de gestão conjunta ou partilhada, o que não sucedeu. De facto, reduziu-se mesmo a posição procedimental das Regiões Autónomas no seu processo de elaboração, tendo-se, além do mais, comprimido as competências de ordenamento do território que, até então, estavam alocadas a esfera da Região Autónoma, por força do disposto nos artigos 53.º e 57.º do EPARAA. – Assim acontece com o n.º 3 do artigo 5.º de Decreto-Lei n.º 38/2015, ao determinar que, para garantir uma melhor articulação e compatibilização entre os planos de situação e de afetação e os demais instrumentos de gestão territorial preexistentes, aqueles últimos devem conter uma iden- tificação expressa “das normas incompatíveis dos programas e planos territoriais preexistentes que devem ser revogadas ou alteradas”. Deste modo, esta disposição assume que os planos de situação ou de afetação elaborados pelo Governo da República prevalecem sobre os programas e planos ter- ritoriais adotados pela Região Autónoma ao abrigo da sua competência normativa específica, iden- tificada no artigo 57.º do EPARAA. Ao fazê-lo, está a comprimir a competência legislativa regional à margem do texto constitucional e estatutário, sendo por isso inconstitucional, por violação do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º e do n.º 1 do artigo 228.º, ambos da CRP. – Por seu turno, o artigo 12.º desse Decreto-Lei determina que a competência para a elaboração de um plano de situação compete exclusivamente ao Governo da República (cfr., em especial, o n.º 6), reduzindo o papel da Região Autónoma a um direito não qualificado de consulta, ou a um direito de elaboração (mas não de aprovação) de um plano de situação dos espaços marítimos adjacentes até às 200 milhas marítimas. Ao fazê-lo, está a violar o disposto nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA, sendo por isso ilegal, na medida em que descura o facto de estatutariamente este poder dever ser par- tilhado ou exercido conjuntamente. Pelas mesmas razões, o artigo 18.º do mesmo diploma, ao espe- cificar que o plano de situação elaborado pe1a Região Autónoma tem de ser aprovado pelo Governo da República, está a violar o disposto nos n. os 1 e 3 do artigo 8.º do EPARAA, sendo por isso ilegal. – Em termos simétricos, os artigos 22.º e 26.º, ao determinarem a aplicação, no âmbito do plano de afetação, do disposto nos n. os 2 a 6 do artigo 12.º e no artigo 18.º, violam igualmente o disposto nos n. os 1 e 3 do artigo 8.° do EPARAA. – Acresce que os artigos 12.º, 18.º, 22.º e 26.º, ao comprimirem a competência normativa regional à margem do texto constitucional e estatutário, [designadamente das competências especificamente identificadas na alínea a) do n.º 2 do artigo 53.º e no artigo 57.º do EPARAA], são inconstitucionais, por violação do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º e no n.º 1 do artigo 228.º da CRP. – Ainda neste quadro, o disposto no n.º 2 do artigo 15.º – ao determinar que o parecer da comissão consultiva, que integra os representantes das Regiões Autónomas (cfr. n.º 2 do artigo 14.º) e emite
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