TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
507 acórdão n.º 193/16 destinadas a justificar material e formalmente tal ingerência, devendo a mesma constituir uma ultima ratio , em ordem à salvaguardar um bem maior que é a defesa da integridade física e psicológica e da possibilidade de desenvolvimento da personalidade dos próprios filhos, quando aqueles bens sejam colocados em perigo por ação ou omissão dos respetivos pais. VIII– Estando em causa a defesa de um direito fundamental com a natureza de direito, liberdade e garantia – como sucede em relação ao direito à convivência entre os pais e os seus filhos, nos termos do artigo 36.º, n.º 6, da Constituição –, é claro que as exigências relativas à conformação do processo surgem de modo reforçado, sendo fundamental uma compreensão material e lata do princípio do contradi- tório, enquanto expressão da garantia do acesso ao direito e como condição da equidade do próprio processo, concretizada no princípio da participação efetiva no desenvolvimento do litígio, a qual pres- supõe a sua capacidade de dialogar de “igual para igual” com as outras partes, o que exige que esta seja informada e devidamente habilitada à compreensão da complexidade do objeto da causa, em especial, quando exista um grande desequilíbrio e estejam em causa no processo bens fundamentais, pode jus- tificar-se a assistência obrigatória por advogado, como garantia de um mínimo de justiça processual e da possibilidade de uma defesa minimamente eficaz ainda antes da própria decisão. IX – Embora a regra imposta pelo princípio do acesso ao direito e aos tribunais seja o patrocínio judiciário meramente facultativo e o correspondente direito a escolher o seu próprio advogado, a imposição de recurso à assistência de advogados, devidamente inscritos na respetiva Ordem, para efeitos de patrocínio judiciário, pelo menos para certo tipo de processos – e que também é constitucionalmente admissível –, assenta «em ponderosas razões de ordem substancial, visando não só a salvaguarda de interesses de ordem pública, nomeadamente os da realização, da justiça e do direito, mas também os próprios interesses dos patrocinados». X – Manifestamente, é esse o caso da decisão judicial que tem por objeto verificar se, em face do incum- primento dos deveres fundamentais correspondentes ao exercício das responsabilidades parentais, os filhos devem ser separados dos seus progenitores; estando em causa a limitação significativa por via de decisão judicial de um bem fundamental tutelado enquanto direito, liberdade e garantia como o direito à convivência entre pais e filhos consagrado no artigo 36.º, n.º 6, da Constituição, o princípio da participação efetiva no desenvolvimento do litígio ou do processo não se basta com a mera presença dos interessados e a sua participação pessoal; tal princípio reclama, cumulativamente, que os mesmos sejam devidamente assistidos antes da decisão por quem esteja em condições de “descodificar” o que se passa e esclarecer cabalmente quais as consequências processuais dos diferentes impulsos ou omis- sões e, bem assim, sobre as opções que se vão abrindo ou fechando; de outro modo, não se mostra assegurado, na medida exigida por um processo justo, o direito ao contraditório, ínsito na garantia do processo equitativo prevista no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição. XI – No processo judicial de promoção e proteção regulado pela LPCJP em que esteja em causa aplicar a medida de promoção e proteção de confiança da criança ou jovem a pessoa selecionada para a adoção ou a instituição com vista a futura adoção prevista no respetivo artigo 35.º, n.º 1, alínea g) , a fase em que mais é necessário o apoio por advogado é, pela sua centralidade e importância, aquela que cor- responde ao debate judicial previsto no artigo 114.º e regulado nos artigos 115.º a 119.º da mesma lei, pois é aí que todas as provas e todas as razões têm de ser produzidas, avaliadas e discutidas e, por isso mesmo, o contraditório, entendido como garantia da participação efetiva no desenvolvimento do processo, exige que, logo na preparação de um debate judicial em que se equacione a aplicação da
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