TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

418 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL impõe a previsão pelo legislador ordinário de um grau de recurso, pois “tal garantia, conjugada com outros parâ- metros constitucionais, pressupõe, igualmente, que na sua regulação o legislador não adote soluções arbitrárias e desproporcionadas, limitativas das possibilidades de recorrer – mesmo quando se trate de recursos apenas legal- mente previstos e não constitucionalmente obrigatórios (assim, vejam-se os Acórdãos do Tribunal Constitucional n. os 1229/96 e 462/03) […]”.» Ou seja, e seguindo a síntese da jurisprudência uniforme e reiterada deste Tribunal em matéria de direito ao recurso formulada no Acórdão n.º 151/15: « [F]ora do processo penal e quando não esteja em causa a violação pela decisão jurisdicional de direitos funda- mentais a Constituição não impõe a consagração do direito ao recurso, dispondo o legislador do poder de regular, com larga margem de liberdade, a recorribilidade das decisões judiciais. Contudo, quando crie um qualquer meio recursório, designadamente em processo civil, destinado a permi- tir que os interessados impugnem as decisões proferidas por um tribunal para outro tribunal hierarquicamente superior, o legislador está obrigado a regular a utilização desse meio processual, com respeito pelos imperativos constitucionais.» (itálico aditado) Por outro lado, no processo penal, o Tribunal Constitucional tem sido firme no entendimento de que não decorre do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição o direito a um duplo grau de recurso correspondente a um terceiro grau jurisdição [ver, entre muitos outros, os Acórdãos n. os 189/01, 336/01, 369/01, 49/03, 377/03, 495/03 e 102/04; e mais recentemente, e com referência às alíneas e) e f ) do artigo 400.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, os Acórdãos n. os 276/15 e 298/15]. Mas é também verdade que, a propósito do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal, o Acórdão n.º 412/15, invocado pelos recorrentes, veio considerar constitucionalmente exigível um terceiro grau de jurisdição no domínio processual penal em circunstâncias muito particulares, designadamente no caso de a relação, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em 1.ª instância, condenar o arguido em pena de prisão efetiva. Colhe-se da fundamentação deste aresto que pesaram decisivamente, não apenas o valor fundamental da liberdade, como a própria evolução da legislação infraconstitucional aplicável. 11. No caso vertente, que – recorde-se – respeita exclusivamente à efetivação de responsabilidade financeira reintegratória, não está em causa o juízo sobre um ilícito sancionatório (qualificando a responsabilidade finan- ceira sancionatória como um «ilícito sancionatório autónomo», vide o Acórdão n.º 635/11). Quando muito, poder-se-á falar de uma responsabilidade conexa, porventura análoga à obrigação de indemnizar as perdas e danos emergentes de ilícito penal, e que é regulada por lei diferente daquela que pune tal ilícito (cfr. o artigo 129.º do Código Penal). A norma sindicada situa-se, por isso, fora do âmbito de aplicação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. Em consonância, não há lugar à aplicação imediata ou subsidiária nem do direito penal nem do direito processual penal (cfr., desde logo, o artigo 80.º da LOPTC, nas suas diversas redações; vide também, o artigo 67.º, n.º 4, da mesma Lei, na redação dada pela Lei n.º 20/2015, de 9 de março). Inexistem, deste modo, razões que justifiquem a discussão in casu seja do mérito da doutrina sufragada no citado Acórdão n.º 412/15, seja da sua eventual transposição para outros domínios sancionatórios. E de qual- quer modo, quanto a este último aspeto, e tal como recentemente assinalado no Acórdão n.º 373/15, “importa ter em atenção que o conteúdo das garantias processuais é diferenciado, consoante o domínio do direito puni- tivo em que se situe a sua aplicação[, já que], atendendo à diferente natureza do ilícito de mera ordenação e à sua menor ressonância ética, em comparação com o ilícito criminal, é menor o peso do regime garantístico, pelo que as garantias constitucionais previstas para os ilícitos de natureza criminal não são necessariamente aplicáveis aos ilícitos contraordenacionais ou a outros ilícitos no âmbito de direito sancionatório (cfr., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n. os 158/92, 50/99, 33/02, 659/06, 99/09 e 135/09)”.

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