TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

404 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – O Tribunal entende, isso sim, dever reafirmar a sua jurisprudência em matéria de direito ao recurso fora do âmbito do processo penal; residindo a particularidade que existe nos recursos interpostos de decisões de efetivação de responsabilidade financeira reintegratória tomadas em primeira instância pela 3.ª Secção do Tribunal de Contas na circunstância de tais recursos serem julgados pelo plenário dessa mesma Secção, ainda que sem a intervenção do juiz que tomou a decisão recorrida, esta especia- lidade é, todavia, indissociável – e, desse modo, plenamente justificada – da natureza constitucional do Tribunal de Contas como órgão jurisdicional supremo de “fiscalização da legalidade das despesas públicas e de julgamento de contas” com competência para “efetivar a responsabilidade por infrações financeiras”; com efeito, e sem prejuízo do recurso de constitucionalidade, as decisões do Tribunal de Contas não são recorríveis para qualquer outro tribunal da ordem jurídica portuguesa. V – Relativamente ao parâmetro do direito a um processo justo e equitativo, que implica um «efetivo direito de defesa», a limitação dos graus de jurisdição, nomeadamente a não previsão de um segundo grau de recurso, é uma opção que resulta da “liberdade de conformação do legislador na concreta modelação do processo” que, no caso da efetivação de responsabilidade financeira reintegratória, pre- viu um grau de recurso aberto a qualquer uma das partes, não se afigurando arbitrária nem desrazoável ou desproporcionada a limitação a esse grau de recurso e, sobretudo, não pondo em causa o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva. VI – Tem este Tribunal entendido que a disciplina do direito ao recurso em geral deve conciliar, por um lado, a garantia de defesa dos direitos das partes e de uma maior qualidade da justiça; e, por outro lado, a garantia de eficiência do sistema judiciário; ora, no caso do Tribunal de Contas, e em particu- lar no domínio das decisões de efetivação da responsabilidade financeira reintegratória, um eventual terceiro grau de jurisdição não seria nunca comparável ao terceiro grau de jurisdição que existe no âmbito dos tribunais judiciais: se se pode divisar algum paralelismo entre juiz da 3.ª Secção do Tri- bunal de Contas, a decidir em primeira instância, e plenário da mesma Secção, como instância de recurso, e tribunal judicial de primeira instância e relação, o mesmo paralelismo não existe no tocante ao confronto entre plenário geral do Tribunal de Contas e Supremo Tribunal de Justiça; daí ser mate- rialmente justificada a limitação a dois graus de jurisdição da apreciação e decisão referente a matérias de efetivação de responsabilidade financeira reintegratória. VII – A especificidade da estrutura e modo de funcionamento do Tribunal de Contas justifica também a não comparabilidade do sistema de recursos neste Tribunal com o existente noutras ordens de tribunais, como sejam as dos tribunais judiciais ou dos tribunais administrativos e fiscais, o que retira funda- mento à invocada violação do princípio da igualdade num plano sistémico; e, ainda que se pudesse considerar existir uma incongruência entre o sistema de recursos aplicável nos processos jurisdicionais da competência do Tribunal de Contas e o sistema de recursos existente no âmbito de outras ordens jurisdicionais, a verdade é que tal incoerência não relevaria como violação do princípio da igualdade. VIII– A norma sindicada não trata desigualmente as partes no processo, não existindo qualquer desigualda- de de tratamento: a parte que fique vencida no julgamento em primeira instância, seja ela o deman- dante ou demandado, pode recorrer para o plenário da 3.ª Secção do Tribunal de Contas; e a decisão de tal recurso, seja ela qual for, e com ressalva da oposição de julgados, não é recorrível para o plenário geral do Tribunal de Contas; a lei processual aplicável assegura a ambas as partes – demandante e demandado – um único grau de recurso, independentemente de a decisão em primeira instância ser favorável a uma ou a outra.

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