TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

399 acórdão n.º 106/16 legislador quanto ao fundamento subjacente à fixação do requisito objetivo (de verificação negativa) previsto nas normas ora sindicadas. Sendo o fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade em causa o resultado da ponderação, feita pelo legislador, sobre o quanto a ofensa, por via da prática de um crime, indicia o desrespeito pelos valores comunitários a que o ordenamento jurídico nacional conferiu tutela penal, as normas que preveem tal fundamento não podem deixar de ser interpretadas em conformidade com a natureza jusfundamental do direito à nacionalidade – para mais integrado na categoria de direitos, liberdades e garantias –, conferida pela Constituição de modo a levar em conta a ponderação feita pelo mesmo legislador em sede de cessação da vigência no registo criminal das decisões nele inscritas, assim correspondendo a uma reabilitação legal, sob pena de, por essa via, fazer vigorar automaticamente, para aquele efeito, o desvalor da ofensa a bens jurídicos (corporizado na condenação penal) que, por outra via, a mesma comunidade política tem já por superado. Note-se que o entendimento que leva em conta a aceitação da relevância da reabilitação legal ou de direito para efeitos de aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização foi já defendido, quanto à norma de conteúdo e finalidade em tudo semelhantes às normas ora sob escrutínio, plasmada no artigo 6.º, n.º 1, alínea d) , da Lei da Nacionalidade portuguesa, na jurisprudência constante do acórdão da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 21 de maio de 2015, no Processo n.º 129/15 (disponível em www.dgsi.pt ) e assim sumariada: «O requisito contido na alínea d) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei da Nacionali- dade, relativo à aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização, deve ser conjugado com o instituto da reabilitação legal ou de direito» – entendimento não perfilhado nestes moldes pela decisão ora recorrida.  Assim, porque não se afiguraria constitucionalmente admissível uma interpretação das normas da alínea b) do artigo 9.º da Lei da Nacionalidade portuguesa e da alínea b) do n.º 2 do artigo 56.º do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, nas versões aplicadas nos autos, que desconsiderasse a ponderação do legisla- dor efetuada em sede de cessação da vigência da condenação penal inscrita no registo criminal e seu cance- lamento e a correspondente reabilitação legal, sob pena de contradição intrassistémica, justifica-se proferir uma decisão interpretativa, ao abrigo do disposto no artigo 80.º, n.º 3, da LTC, devendo o Tribunal recor- rido adotar a interpretação que se julgou conforme à Constituição e, assim, reformular a fundamentação da solução encontrada para o caso concreto ali em julgamento. III – Decisão 21. Pelo exposto, decide-se: a) Interpretar as normas da alínea b) do artigo 9.º da Lei da Nacionalidade portuguesa e da alínea b) do n.º 2 do artigo 56.º do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa no sentido de que o impedi- mento de adquirir a nacionalidade portuguesa, nelas previsto, decorrente da condenação em pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, deve ter em conta a ponderação do legislador efetuada em sede de cessação da vigência da condenação penal inscrita no registo criminal e seu cancelamento e correspondente reabilitação legal; E, em consequência, embora com diverso fundamento, b) Conceder provimento ao recurso e, em consequência, determinar a reforma da decisão recorrida de modo a aplicar as referidas normas com aquele sentido interpretativo. Sem custas, por não serem legalmente devidas. Lisboa, 24 de fevereiro de 2016. – Maria José Rangel de Mesquita – Lino Rodrigues Ribeiro – Catarina Sarmento e Castro (com declaração) – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.

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