TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

396 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 19.2. Diga-se, desde já, que igualmente não se mostra ofendido o princípio enunciado no artigo 30.º, n.º 1, da Constituição, já que não encontra aqui aplicação.  Com efeito, quando a Constituição estabelece que não pode haver penas nem medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade com carácter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida, permite identificar, como escopo principal da norma constitucional, o estabelecimento de limites (temporais defi- nidos) às sanções criminais ou de outros ramos do direito sancionatório, dirigindo-se, assim, em primeira linha, ao legislador penal. Falta-lhe, por isso, a virtualidade de poder ser tida como parâmetro para julgar da constitucionalidade das normas legais que estabelecem, entre os pressupostos para a aquisição da nacionali- dade portuguesa, o requisito de não condenação por crime punível com pena acima de determinado limite (tal como configurado pelo legislador penal no respeito daquele comando constitucional), como é o caso. Bem assim, não é neste princípio da definição e limitação temporal das penas (ou outras medidas punitivas), sobretudo em correspondência com o direito à liberdade pessoal, que encontramos o valor que possa ser desrespeitado pela relevância atribuída a um facto ocorrido há dezenas de anos ( in casu a sentença criminal data de 1992 – cfr. supra, 6) para o efeito de fundamentar a oposição à aquisição da nacionalidade no caso vertente. É que das normas em causa, mesmo assim interpretadas, não resulta a «perpetuidade» da pena então determinada.  Ora, se a dimensão normativa que o julgador entendeu derivar das normas legais sob escrutínio e que justificou a sua desaplicação – deste modo obstando à não relevância do decurso do tempo e das consequên- cias já produzidas por esse decurso na vigência do registo criminal do requerente da nacionalidade portu- guesa – não merece censura à luz das disposições constitucionais apreciadas, é de questionar se tais normas (e sua dimensão normativa) ainda mereceriam censura em face de (outros) valores e princípios plasmados na Constituição, como o princípio da proporcionalidade (também invocado pela decisão ora recorrida – cfr. III, 2.2., supra, 9.), enquanto princípio geral da atuação do poder público (neste sentido, em especial, os Acórdãos deste Tribunal n.º 187/01 e n.º 73/09). Todavia, tal apreciação pode afigurar-se desprovida de utilidade se for possível descortinar ainda nas normas em causa um sentido interpretativo consonante com a Constituição e com o carácter jusfundamental do direito à nacionalidade, ínsito na Lei Fundamental, acima mencionado, e também decorrente das normas de Direito Internacional recebidas pelo ordenamento jurídi- co-constitucional nacional – o que se analisa de seguida. 20. Da regulação, feita pelo legislador, do direito à aquisição da nacionalidade portuguesa resulta que o fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade ou adoção estabelecido na alínea b) do artigo 9.º da Lei da Nacionalidade portuguesa [reproduzido no artigo 56.º, n.º 2, alínea b) , do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa] constitui um requisito (de verificação negativa) de acesso à nacionalidade derivada [e assim também presente no artigo 6.º, n.º 1, alínea a) , da Lei da Nacionalidade que à aquisição da nacionalidade por naturalização se refere]. Dele decorre que a condenação, por sentença transitada em julgado, por crime punível com uma pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos é razão impeditiva do acesso àquele direito, operando de modo automático ex vi legis – não obstante a pena se poder encontrar já extinta e expurgada do registo criminal nos termos legais vigentes [como sucede in casu e invocam quer a decisão recorrida (cfr. III, 2.1., supra 9), quer o recorrente Ministério Público (cfr. VII – Conclusões, 53, supra, I, 4)].  É certo que a Lei da Nacionalidade portuguesa não refere qualquer limite temporal nem prevê a situa- ção de ter ocorrido a cessação da vigência da decisão que aplica a pena para os efeitos da aplicação dos seus artigos 6.º ou 9.º (podendo aqui contrapor-se as soluções já adotadas nos ordenamentos estrangeiros acima referidos, prevendo tanto a Lei da Cidadania italiana como o Código Civil francês que o requisito – nega- tivo – da condenação penal não se aplica em caso de reabilitação do condenado ou cessação da vigência da decisão no registo criminal).  Como se afirmou já, é a própria Constituição que comete ao legislador a tarefa de concretizar o direito a aceder à cidadania portuguesa, resultando essa incumbência na Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da

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