TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

38 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL podem ser considerados incompatíveis com a autonomia patrimonial ou um nível de vida satisfatório dos beneficiários da subvenção vitalícia. Mas ainda que assim não fosse, sempre haveria que relevar as importantes razões de interesse público justificativas da modificação do comportamento gerador da expectativa, como são, para além das razões estritamente financeiras mencionadas no Acórdão, as preocupações de justiça social e de coerência valorativa contrárias à continuação das condições privilegiadas, nomeadamente devido à isenção de condição de recur- sos genericamente aplicável a apoios sociais, de atribuição de um “puro benefício”. – Pedro Machete. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido por entender que a introdução temporária de uma condição de recursos na atribuição de prestações não contributivas, como é o caso da subvenção mensal vitalícia criada pela Lei n.º 4/85, de 9 de abril, não viola o princípio constitucional da proteção da confiança. Em primeiro lugar, impõe-se sublinhar que tal medida, constante do artigo 80.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2015), tem natureza temporária, ou seja, destina-se a vigorar apenas no ano económico de 2015. De facto, as normas daquele artigo reproduzem ipsis verbis as normas do artigo 77.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2014), o que indicia ser uma norma orçamental. Se fosse uma medida de natureza definitiva, a mesma já resultaria do artigo 77.º da LOE de 2014, constituindo o preceito objeto de fiscalização uma duplicação desnecessária, ou então o legislador teria introduzido tal inovação na Lei n.º 4/85, que é a sede própria para alterar de forma duradoura o regime dessas subvenções, como sempre fez no passado. Em segundo lugar, se a natureza temporária da condição de recursos faz com que a mesma resista aos testes inerentes às máximas de idoneidade, necessidade e proporcionalidade, uma vez que para o objetivo de consolidação das contas públicas não é uma solução normativa inadequada, desnecessária ou intolerável, como de resto aconteceu com as reduções remuneratórias impostas aos trabalhadores da Administração Pública no ano económico de 2015, também não se pode afirmar que uma prestação não contributiva dessa natureza esteja a salvo de alterações legislativas em sentido desfavorável aos seus destinatários. O legislador nunca deu tal sinal, pois nas sucessivas alterações que fez ao regime das subvenções evidenciou a intenção de reduzir o seu montante ou mesmo de as eliminar, como efetivamente ocorreu em 2005. Não há pois uma situação de confiança legítima imputável ao Estado no sentido de que o valor dessas prestações, que não tem a mesma proteção constitucional que as remunerações e as pensões de reforma, nunca poderia ser afetado. E se o comportamento do legislador não contribui para a formação, por parte dos potenciais beneficiários, de expectativas fundadas na intangibilidade ou na subsistência do regime jurídico das pensões em pagamento, de igual modo também não alimentou expectativas de que manteria permanentemente um regime legal compatível com a natureza da subvenção, ou que nunca alteraria as suas características essenciais. Por fim, não me parece que tomar como valor de referência para a fixação do montante da subvenção os rendimentos do agregado familiar descaracterize a sua natureza, em termos tais que fosse imprevisível qualquer alteração nesse sentido. O regime da subvenção mensal vitalícia revela que a prestação assume natureza aná- loga à das prestações da segurança social, já que contempla situações de incapacidade e de decesso, permite a transmissibilidade “ mortis causa ” do direito, é auferida após os 55 anos de idade e é cumulável com a pensão de aposentação ou de reforma. Como o tempo de exercício do cargo político enquanto tal não garante o direito à aposentação, embora conte para esse efeito no cargo de origem, a lei pretende compensar socialmente o titu- lar daquele cargo na velhice, invalidez e morte com a subvenção mensal vitalícia (cfr. Pareceres do Conselho Consultivo Procuradoria Geral da República, n. os 97/1998, 97/1990, 73/1992 e 1/2003, in http:www.dgsi.pt ) . Pretendeu-se valorizar a função política através da concessão de uma subvenção suplementar não contributiva que atenue os efeitos prejudiciais da interrupção da atividade profissional em razão da dedicação ao exercício dessa função. A integração no complexo normativo relativo ao regime dos direitos de índole social, destinado

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