TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
379 acórdão n.º 106/16 condenação, na medida em que se impõe inexoravelmente ex vi legis na esfera jurídica do interessado, não deixando à Administração qualquer margem de apreciação e ponderação. Além disso, se “não pode haver penas nem medidas privativas ou restritivas da liberdade com carácter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida” (n.º 1 do artigo 30.º da Constituição), de igual modo não poderão admi- tir-se efeitos delas, mais a mais automáticos, de duração ilimitada ou indefinida. Negar ao aqui réu o direito de adquirir a nacionalidade portuguesa com o fundamento ora em apreço seria objectivamente perpetuar a condenação que sofreu há vinte anos atrás, condenação que passaria a ser um ferrete; um labéu, que o acompanharia durante toda a vida, em flagrante violação da dignidade da pessoa humana, e que em nada contribuiria para a sua reinserção na sociedade. A negação do direito de adquirir a nacionalidade portuguesa com o referido fundamento violaria, semelhante- mente, o princípio da proporcionalidade nos seus elementos necessidade e adequação. Com efeito o impedimento só se justificaria se o crime por que o aqui réu foi condenado tivesse sido cometido com o fim de, ilegitimamente obter a nacionalidade portuguesa, e o impedimento visasse obstar à concretização desse intento, ou se fosse moti- vado por ódio aos portugueses enquanto povo – o que não é o caso (sobre o ponto cfr. Damião da Cunha, in Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, 2.ª edição, Notas ao n.º 4 do artigo 30). Em suma, as al. b) do artigo 9.º da LN e b) do n.º 2 do artigo 56º do RN são inconstitucionais por violação das normas e princípios constitucionais referidos – o que determina a sua desaplicação no caso vertente, por força da consideração entrosada dos artigos 3.º, 204.º e 277.º da Constituição elo, n.º 2, do ETAF). Irrelevando o fundamento em questão, cai a oposição, ante a tudo o que ficou dito.». 10. É desta sentença que se recorre nos presentes autos. 11. O presente recurso foi interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, estando a sua admissibilidade dependente da verificação de dois pressupostos: i) que a decisão recorrida tenha recusado efetivamente a aplicação de certa norma ou interpretação normativa, relevante para a resolução do caso; e ii) que tal desaplicação normativa se funde num juízo de inconstitucionalidade do regime jurídico nela estabelecido. Para a apreensão do objeto do presente recurso mostra-se relevante partir do teor do requerimento de interposição do recurso – in casu , obrigatório para o Ministério Público nos termos do poder vinculado previsto no artigo 72.º, n.º 3, da LTC –, no confronto com o decidido na sentença judicial ora recorrida – sentença do TACL de 16 de novembro de 2012, a fls. 199-210 dos presentes autos – proferida no âmbito da ação especial de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa deduzida pelo Ministério Público. 12. Verifica-se que na sentença do TACL, ora recorrida, é formulado um juízo de desvalor constitucio- nal quanto às normas constantes das alíneas b) do artigo 9.º da Lei da Nacionalidade (Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, na redação dada pela Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17 de abril) e do n.º 2 do artigo 56.º do Regula- mento da Nacionalidade Portuguesa (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 237-A/2006, de 14 de dezembro), que determina a respetiva desaplicação ao caso (cfr. sentença recorrida, acima transcrita em 9., fls. 209). É este o teor das normas legais em causa (na versão vigente à data da decisão judicial recorrida): «(…) Artigo 9.º da Lei da Nacionalidade (Fundamentos) Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa: a) A inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional; b) A condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa;
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