TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
373 acórdão n.º 106/16 VIII– Igualmente não se mostra ofendido o princípio enunciado no artigo 30.º, n.º 1, da Constituição, já que a norma não tem a virtualidade de poder ser tida como parâmetro para julgar da constitucio- nalidade das normas legais que estabelecem, entre os pressupostos para a aquisição da nacionalida- de portuguesa, o requisito de não condenação por crime punível com pena acima de determinado limite, como é o caso; bem assim, não é neste princípio da definição e limitação temporal das penas (ou outras medidas punitivas), sobretudo em correspondência com o direito à liberdade pessoal, que encontramos o valor que possa ser desrespeitado pela relevância atribuída a um facto ocorrido há deze- nas de anos para o efeito de fundamentar a oposição à aquisição da nacionalidade no caso vertente, pois das normas em causa, mesmo assim interpretadas, não resulta a «perpetuidade» da pena então determinada. IX – Da ponderação efetuada pelo legislador ordinário, no plano geral e abstrato, em duas sedes dis- tintas – a da fixação dos critérios objetivos de que depende a aquisição da nacionalidade por efeito da vontade e a pertença à comunidade política, por um lado, e a da fixação dos prazos de que depende a cessação da vigência no registo criminal das decisões penais condenatórias e o seu cancelamento definitivo, por outro –, resulta uma aparente contradição no quadro do sistema jurídico já que sendo as ponderações, em abstrato efetuadas, de sinal contrário, a ponderação efetuada na primeira daqueles sedes tem por efeito, prima facie , neutralizar ou nulificar a ponde- ração efetuada na segunda. X – Ora tal aparente contradição intrassistémica não pode deixar de ser resolvida de harmonia com a Constituição e com a jusfundamentalidade reconhecida pela mesma Lei Fundamental ao direito (fun- damental) – e, sublinhe-se, integrado dos direitos, liberdades e garantias pessoais – em causa: o direito à nacionalidade portuguesa, previsto e tutelado pelo artigo 26.º, n.º 1 (e n.º 4) da Constituição; assim, porque não se afiguraria constitucionalmente admissível uma interpretação das normas sub iudicio , que desconsiderasse a ponderação do legislador efetuada em sede de cessação da vigência da conde- nação penal inscrita no registo criminal e seu cancelamento e a correspondente reabilitação legal, justifica-se proferir uma decisão interpretativa, ao abrigo do disposto no artigo 80.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, devendo o tribunal recorrido adotar a interpretação que se julgou conforme à Constituição e, assim, reformular a fundamentação da solução encontrada para o caso concreto ali em julgamento. Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TACL), em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A., foi interposto recurso, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), na sua atual versão, da sentença daquele tribunal de 16 de novembro de 2012 (de fls. 199-210), que julgou improcedente a ação de oposição à aquisi- ção da nacionalidade portuguesa pelo ora recorrido, deduzida pelo Ministério Público com fundamentos na inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional e na condenação em crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos segundo a lei portuguesa.
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