TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
344 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E trata-se, também, de medida de caráter permanente, uma vez que, pelas razões acabadas de expor, jamais poderá ser atingida a condição prevista no n.º 6 do citado artigo 75.º da Lei n.º 83-C/2013 – ‘O pagamento de complementos de pensão é retomado num contexto de reposição do equilíbrio financeiro das empresas do setor público empresarial, após a verificação de três anos consecutivos de resultados líquidos positivos’. Não existe fundamento que justifique o sacrifício especial e desproporcionado desses trabalhadores, que cons- titui, assim, uma discriminação infundada, como acontece com os trabalhadores representados pelo recorrente, que, para além da sua sujeição à contribuição extraordinária de solidariedade a que estão transitoriamente sujeitos os demais reformados e aposentados, viram a sua pensão reduzida, havendo casos em que tal redução atingiu 60% do total do rendimento desses trabalhadores. 5. Pelo que tal medida viola, também, o princípio da igualdade dos cidadãos, previsto no artigo 13.º da CRP, porquanto penaliza especialmente, de forma brutal e desproporcionada, os trabalhadores de algumas empresas públicas em relação à generalidade dos demais trabalhadores e pensionistas, inclusive em relação aos demais traba- lhadores e pensionistas do setor público administrativo e empresarial. 6. E viola também, claramente, o princípio da proteção da confiança, ínsito no artigo 2.º da CRP. Note-se que, recentemente, uma medida legislativa que tinha em vista reduzir, em cerca de 10%, as pensões de aposentação dos funcionários públicos com fundamento, alegadamente, no facto de essas pensões serem, propor- cionalmente, superiores às atribuídas pela Segurança Social, foi declarada inconstitucional por violação do referido princípio da proteção da confiança. Trata-se das alíneas a) , b) , c) e d) do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto da Assembleia da República n.º 187/XII, declaradas inconstitucionais pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 862/13, com base na violação do princí- pio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da CRP. Isto, quando é certo que, nesse caso, a redução da pensão era da ordem dos 10% e os aposentados e demais pensionistas não seriam atingidos pelos efeitos da chamada contribuição extraordinária de solidariedade. Ora, na situação sub judice , em que o corte das pensões chega a atingir os 50%, verificam-se, por maioria de razão, os fundamentos em que o Tribunal Constitucional baseou o seu Acórdão n.º 862/13. Na verdade, trata-se da frustração, de forma iníqua e desproporcionada, de uma expectativa legítima com base na qual estes cidadãos moldaram as suas vidas e quando se encontram já numa situação face à qual não têm possi- bilidade de as refazer, havendo aqui também que ter em conta o artigo 72.º, n.º 1, da Constituição, que dispõe que ‘as pessoas idosas têm direito à segurança económica e a condições de habitação e convívio familiar e comunitário que respeitem a sua autonomia pessoal e evitem e superem o isolamento ou a marginalização social’. 7. Como determinou o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, 4.ª Secção, no âmbito do processo n.º 333/14.9TTLRS.L1, em 26 de janeiro de 2015, disponível em www.dgsi.pt , processo no qual foram deduzidos causa de pedir e pedidos idênticos aos dos presentes autos por parte de 9 trabalhadores reformados, os efeitos desta norma podem determinar casos tão graves como o de deixar de se poder comprar um medicamento ou o de entrar numa espiral de incumprimento de contratos de crédito, geradora de situações de insolvência. Efeitos que sucederam e ainda sucedem. Num Estado em que a mesma maioria representativa dos cidadãos que aprovaram a norma em causa aprovou já dezenas, senão centenas de normas, destinadas a evitar esse efeito perverso do empobrecimento imediato de um cidadão, ou a impor um limite, por exemplo, à percentagem da remuneração de uma pessoa que pode ser afetada por uma penhora. Lembremo-nos que, pelos termos em que a norma em causa está escrita, o que sucedeu foi que a grande maio- ria dos trabalhadores afetados pela mesma, que auferiam complementos de valor quase igual ao da sua reforma, viram o seu rendimento repentinamente reduzido em 50%. Daí constar até dos votos de vencido presentes no Acórdão do Tribunal Constitucional invocado no douto Acórdão recorrido, a menção expressa e um alerta para a situação concreta dos trabalhadores da A. e do Metro. Afirmando-se igualmente no voto de vencida da Excelentíssima Senhora Desembargadora Maria Fernandes, constante do Acórdão ora recorrido, que o caso concreto dos presentes autos impõe solução diferente da que vem sendo perfilhada pela justiça.
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