TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

33 acórdão n.º 3/16 DECLARAÇÃO DE VOTO Entendo que a norma do artigo 80.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro (LOE 2015) – ainda que se considere como valendo para além do ano orçamental a que respeita aquela Lei, o que, todavia, e pelas razões adiante enunciadas, não sucede – não ultrapassa os limites da liberdade de conformação do legislador democrático. Não compreendo, designadamente, como, depois de negar a existência de uma legítima expec- tativa relativamente a um certo quantum de subvenção vitalícia – e de a qualificar até como um “puro benefí- cio” –, se pode vir, a final, sem caracterizar mais detalhadamente a «expectativa» em causa, considerar existir violação da confiança legítima quanto à manutenção da “natureza da subvenção”, fundada não tanto no que o legislador fez, mas no que ele não fez: como se se pudesse falar aqui de uma espécie de garantia de instituto. A verdade é que, mesmo com essa norma, o legislador continua a garantir aos beneficiários da subvenção vitalícia uma prestação pecuniária para que os mesmos não contribuíram, correspondente a um rendimento mensal médio que, consoante as situações especiais de cada um (por exemplo, os anos de exercício do cargo) pode ir até ao valor de €  2 000. Este valor máximo, em si mesmo considerado, e à luz do contexto econó- mico-social português, não é incompatível com a autonomia patrimonial ou um nível de vida satisfatório. Por isso, a norma ora declarada inconstitucional não desfigurou a subvenção vitalícia conservada em sede de direito transitório: a sua natureza e finalidade de apoiar e compensar os ex-titulares de cargos políticos mantêm-se incólumes. Pela mesma razão, tal solução normativa não põe em causa em termos censuráveis à luz do princípio da proporcionalidade nem a autonomia patrimonial nem um nível de vida minimamente aceitável dos seus beneficiários. Há três aspetos que na economia argumentativa do Acórdão merecem uma análise mais detalhada: A) A questão do caráter transitório ou permanente da norma apreciada 1. Preliminarmente, coloca-se a questão da vigência sucessiva ou permanente do artigo 80.º da LOE 2015. Contrariamente ao entendimento que prevaleceu no Acórdão, o problema reveste importância fun- damental, já que não se vê como a suspensão por tempo limitado e a título excecional da «versão autêntica» da subvenção vitalícia, substituindo-a transitoriamente por uma «versão reduzida e adaptada às necessidades excecionais», pode interferir com a sua natureza: a excecionalidade ou necessidade temporária impõem justa- mente uma adaptação meramente transitória da medida que, por isso mesmo, não é alterada na sua natureza. Com efeito, passado o período de exceção, a medida em causa retoma a sua configuração original. De resto, tratando-se de uma medida transitória inscrita num esforço coletivo de cumprimento de metas orçamentais, a carga negativa para os seus destinatários é muitíssimo menor, ficando vazia de sentido toda a argumentação baseada no excesso da medida de redução ou na desproteção da confiança. Recorde-se que a subvenção vitalícia atribuída aos ex-titulares de cargos políticos é uma prestação para a qual os mesmos não des- contaram – tal subvenção corresponde na verdade a uma prestação não contributiva – e que para a consecução das aludidas metas foi exigido o sacrifício de salários e de prestações contributivas, como as pensões de aposen- tação… Afinal, salários de «funcionários públicos», pensões e outras prestações sociais e a própria subvenção vitalícia reconduzem-se sempre a prestações pecuniárias a pagar por conta do Orçamento do Estado. 2. Segundo o Acórdão, a circunstância de o artigo 80.º da LOE 2015 repetir a solução normativa con- tida na lei orçamental do ano anterior – nomeadamente, no artigo 77.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (LOE 2014) –, “sugere permanência”. Mas não se explica porquê. Note-se que o teor literal de cada um dos dois enunciados em causa – o artigo 77.º da LOE 2014 e o artigo 80.º da LOE 2015 – é, no essencial, idêntico. Assim, idêntica deveria ser a sua natureza quanto à extensão do âmbito de aplicação temporal. A repetição da norma sugere, isso sim, o respetivo caráter tempo- rário. De resto, parece ser esse também o entendimento dos requerentes (cfr. a referência a “normas excecio- nais” no ponto 2.º do seu requerimento).

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