TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
304 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL República Portuguesa, não deixa de acarretar, por um lado uma desvalorização social e reputacional que, inevitavel- mente, é associada a tal sujeição e, por outro, de vincular o arguido a, em sede instrutória e de produção de prova, sofrer a potencial devassa da sua intimidade, quer na vertente do acesso a informação sobre a sua vida privada, quer na da divulgação pública dessa mesma informação. 10. Ou seja, encontrando-se reunidos todos os restantes pressupostos processuais que habilitam o Ministério Público a determinar a suspensão provisória do processo, e verificando-se que a decisão judicial – reconhecendo, ainda que tacitamente, a coleção daqueles pressupostos – discorda de tal determinação apenas por considerar insuficientes as injunções a impor ao arguido, em manifesto prejuízo deste, e cerceando, desnecessária e impre- visivelmente, os seus direitos fundamentais ao bom nome e reputação, e à reserva da intimidade da vida privada, comprova-se a ocorrência da violação do direito fundamental do arguido ao recurso, nos termos concebidos pelo legislador constitucional no n.º 1, do artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa. 11. Mais constatámos, que também com fundamento na violação do princípio fundamental da presunção de inocência consagrado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, a decisão judicial discor- dante da suspensão provisória do processo, fundada em alegada insuficiência das injunções e regras de conduta acordadas entre o Ministério Público e o arguido, viola o direito fundamental ao recurso em processo criminal, plasmado no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. 12. Sintetizando o explanado, nesta parte da nossa argumentação, concluímos que, quer em razão da violação dos direitos fundamentais ao bom nome, reputação, e reserva da intimidade da vida privada, previstos no n.º 1, do artigo 26.º, da Constituição da República Portuguesa; quer em razão da violação do princípio fundamental da presunção de inocência consagrado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa – e contrariando a tese sustentada pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 16/09 –, a decisão judicial discordante da suspensão provisória do processo, fundada em alegada insuficiência das injunções e regras de conduta acordadas entre o Ministé- rio Público e o arguido, viola o direito fundamental ao recurso em processo criminal, prescrito no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, enquanto afloramento do mais abrangente direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 13. Paralelamente, considerámos que a grelha infraconstitucional, a que recorreram os decisores do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 16/09, é, no presente caso, insuficiente para a cabal aferição da constitucio- nalidade ou inconstitucionalidade da interpretação normativa impugnada, a qual determina a irrecorribilidade da decisão judicial de discordância da determinação de suspensão provisória do processo, mesmo quando aquela é suscetível de restringir direitos fundamentais do arguido, razão pela qual não a adotamos, considerando-a inapli- cável no caso vertente. 14. Mais opinámos, que o juiz de instrução não pode, legitimamente, em sede de inquérito criminal, restrin- gindo os direitos do arguido que lhe cumpre garantir, discordar da suspensão provisória do processo, com funda- mento na insuficiência das injunções ou das regras de conduta impostas. 15. Por fim, conjugando as premissas já apuradas com o polimorfismo estatutário do Ministério Público, cons- tatámos que é o próprio Tribunal Constitucional que reconhece – quando o Ministério Público, em sede de recurso processual penal e para defesa da legalidade, intervém no exclusivo interesse da defesa do arguido, como acontece no caso que nos preocupa – a invocabilidade do direito fundamental ao recurso previsto no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. 16. Consequentemente, qualquer restrição ao exercício do poder-dever de defesa da legalidade democrática que, constitucionalmente, incumbe ao Ministério Público, constitui uma violação do seu estatuto constitucional, e, mais especificamente, uma violação do seu poder-dever de defesa da legalidade no exercício da ação penal, com assento no n.º 1 do artigo 219.º da Constituição da República Portuguesa. 17. Assim, conjugando as conclusões parcelares obtidas, depreendemos que a não recorribilidade do despacho judicial de discordância da determinação do Ministério Público de suspensão provisória do processo, com funda- mento na insuficiência das injunções ou das regras de conduta impostas, porque suscetível de restringir direitos fundamentais do arguido, viola o direito constitucional ao recurso em processo criminal, consagrado no n.º 1 do
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