TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016
303 acórdão n.º 101/16 juiz das liberdades e usurpação das funções processuais do Ministério Público é irrecorrível, não violando o direito ao recurso, constitucionalmente tutelado». 3. Prosseguindo o processo os seus trâmites o recorrente alegou, pronunciando-se no sentido de dever ser julgada inconstitucional a interpretação normativa aplicada pelo tribunal recorrido, para o que apresen- tou as seguintes conclusões: «VIII – Conclusões 1. O Ministério Público interpôs recurso facultativo, para este Tribunal Constitucional, do teor da douta decisão de fls. 113 e 114, proferida pelo Exm.º Sr. Presidente do Tribunal da Relação do Porto, “de acordo com o disposto no artigo 70 n.º 1 al. b) da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (…)”. 2. Com a interposição deste recurso, pretende o Ministério Público ver apreciada a inconstitucionalidade da norma constante do “(…) artigo 281.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, conjugado com o Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 16/2009, de 8 de novembro de 2009 (publicado no DR I série de 24 de dezembro de 2009), interpretado no sentido de que a decisão judicial que discordar da suspensão provisória do processo por alegada insuficiência das injunções e regras de conduta acordadas entre o Ministério Público e o arguido, em violação do seu papel de juiz das liberdades e usurpação das funções processuais do Ministério Público é irrecorrível, não vio- lando o direito ao recurso, constitucionalmente tutelado”. 3. Esta interpretação normativa, utilizada na douta decisão recorrida, viola, no entender do Ministério Público, e conforme se pode inferir do teor da reclamação junta aos autos, a fls. 3 a 14 o princípio do direito ao recurso, complementado pelo princípio do acesso ao direito e aos tribunais e da tutela jurisdicional efetiva; e o princípio da legalidade no exercício da ação penal, previstos, respetivamente, nos artigos 20.º, n.º 1; 32.º, n.º 1; e 219.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 4. Procedemos, antes da entrada na análise da matéria de constitucionalidade que alicerça as questões suscita- das, à restrição da interpretação normativa cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada pelo Tribunal Cons- titucional, retirando da formulada no requerimento de interposição de recurso, e acima reproduzida, o segmento: “(…) em violação do seu papel de juiz das liberdades e usurpação das funções processuais do Ministério Público (…)”. 5. Seguidamente, num momento ainda propedêutico, procurámos sublinhar e sanear o equívoco resultante da aplicação, por parte do venerando decisor a quo , como ratio decidendi do douto despacho impugnado, da norma constante do n.º 6 do artigo 281.º do Código de Processo Penal, inaplicável, per se, à situação fáctica solucionanda. 6. Em resultado deste saneamento, optámos por nos pronunciarmos sobre a interpretação normativa substan- tivamente aplicada à resolução do presente pleito, emergente da conjugação entre o artigo 281.º, n.º 6, do Código de Processo Penal e o teor do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 16/09, mas coincidente, no essencial, com o conteúdo material deste aresto. 7. Entrando na substância da questão, apurámos que, por força do disposto no n.º 1 do artigo 32.º da Cons- tituição da República Portuguesa, se encontra previsto, em sede de processo criminal, o direito de recorrer de decisões que restrinjam direitos fundamentais, consagrando o duplo grau de jurisdição. 8. Concretizando, inferimos que a desnecessária sujeição de um cidadão arguido a julgamento em processo criminal, imposta pela discordância judicial, importa, para aquele cidadão, desde logo, a restrição e potencial lesão dos seus direitos ao bom nome e reputação, consagrados no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, e, ainda à restrição do direito à reserva da intimidade da vida privada, com assento constitucional no mesmo normativo. 9. Efetivamente, a sujeição de um cidadão a julgamento em processo criminal, pese embora a consagração constitucional do princípio da presunção de inocência concretizado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição da
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