TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

296 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Uma vez recebido o comprovativo de pagamento da taxa de justiça, bem como os demais elementos previstos na alínea b) do n.º 1 deste do artigo 12.º, «o BNA remete, por via eletrónica, o requerimento de despejo para o tribunal nele indicado, juntamente com o título ou a decisão judicial para desocupação do locado, o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça ou da concessão de apoio judiciário e, se for caso disso, a procuração referida na subalínea ii) da alínea b) do n.º 1, valendo o conjunto destes documentos como requerimento executivo idóneo a iniciar a execução para pagamento de quantia certa» (cfr. n.º 3 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 1/2013). No caso de falta de apresentação pelo senhorio, no prazo de dez dias, do aludido comprovativo, é aplicá- vel o n.º 2 do deste artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, no qual se prevê que tal omissão «é havida como desistência do pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas, não prosseguindo o BNA com os trâmites necessários à execução para pagamento de quantia certa», norma esta que, como vimos, foi em parte objeto de recusa de aplicação pela decisão recorrida. A respeito do sentido desta norma, Laurinda Gemas (Algumas questões controversas do novo regime processual de cessação do contrato de arrendamento, in Revista do Centro de Estudos Judiciários, 2.º Semestre 2013, n.º 2, p. 29) refere que a mesma «não pode ser interpretada de forma puramente literal, sob pena de flagrante inconstitucionalidade», acrescentando que «caso o senhorio se atrase a pagar a taxa de justiça ou considere que não vale já a pena avançar com a execução, designadamente porque não conhece bens ao arrendatário, seria descabido e contrário ao disposto no artigo 290.º do CPC, presumir, de forma inilidível, que tal constitui uma desistência do pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas. Portanto, o que a norma significa é que o senhorio desistiu de intentar ação executiva, não prosseguindo o BNA com os trâmites necessários à execução para pagamento de quantia certa.». Já Rui Pinto (cfr. Manual de Execução e Despejo, p. 1201, nota de rodapé n.º 3478), por sua vez, consi- dera que a cominação prevista nesta norma é «inconstitucional, por desproporcionada, pois, como se sabe, a desistência do pedido importa a extinção dos créditos que se pretendia fazer valer, por força do art. 295.º, n.º 1 = art. 285.º, n.º 1, nCPC. Bastaria que o efeito fosse a desistência da instância (cfr. n.º 2 do mesmo artigo)». Foi justamente neste último sentido que a norma em causa foi interpretada pela decisão recorrida, con- forme se pode constatar pela respetiva fundamentação. Com efeito, considerou tal decisão que a cominação constante desta norma é extremamente gravosa para o requerente, por desproporcionada com a omissão em causa, uma vez que, em face do disposto no artigo 285.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a desistência do pedido extingue o direito que se pretendia fazer valer. Mais entendeu a referida decisão que a norma do n.º 2 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, é difícil de compreender, tendo em conta que, no artigo 15.º-C do NRAU, em que estão previstos os motivos que conduzem à recusa do requerimento de despejo, consta o facto de não se mostrar paga a taxa de justiça [alínea h) do n.º 1]. Por isso, refere-se ainda na aludida decisão, a consequência deveria bastar-se pelo não prosseguimento ou extinção dos trâmites necessários à execução para pagamento de quantia certa ou fazer equivaler tal omissão à desistência da instância, o que permitiria ao requerente faltoso instaurar nova ação para tentar fazer valer o direito invocado. Conclui, por isso, a decisão recorrida que a disposição legal, no segmento em que estabelece que a não apresentação, no prazo de 10 dias, do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, nos termos expostos, é havida como desistência do pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas, é inconstitucional, por violação do disposto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, configurando uma norma que comporta uma restrição desproporcional ao conteúdo essencial do direito de obter tutela jurisdicional efetiva, que aquela norma visa assegurar. Este artigo 20.º da Constituição garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos (n.º 1), impondo ainda que esse direito se efetive através de um processo equi- tativo (n.º 4).

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