TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 95.º Volume \ 2016

294 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Conforme decorre da fundamentação da aludida decisão, o tribunal a quo considerou que a «desistên- cia do pedido» a que faz referência a norma desaplicada tem os efeitos previstos no artigo 285.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, e que, por isso, extingue o direito que se pretendia fazer valer. Ora, tendo sido este o sentido em que a norma sindicada foi interpretada pelo tribunal a quo, esta dimensão normativa deverá integrar o objeto do recurso, de modo a que, sobre a mesma possa incidir o juízo deste Tribunal a respeito da sua conformidade constitucional. Importa, por isso, proceder a uma delimitação do objeto do recurso. Em face do exposto, o objeto do presente recurso consiste no segmento normativo do n.º 2 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, no qual se prevê que “[a] não apresentação, no prazo de 10 dias, do documento previsto na subalínea i) da alínea b) do número anterior, é havida como desistência do pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas (…)”, interpretado no sentido de que tal desistência, em face do disposto no artigo 285.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, extingue o direito que se pretendia fazer valer. 2. Do mérito do recurso Tendo em atenção a delimitação do objeto do recurso ora efetuada, a questão de constitucionalidade que importa apreciar é a de saber se o segmento normativo do n.º 2 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, no qual se prevê que “[a] não apresentação, no prazo de 10 dias, do documento previsto na subalínea i) da alínea b) do número anterior, é havida como desistência do pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas (…)”, interpretado no sentido de que tal desistência, em face do disposto no artigo 285.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, extingue o direito que se pretendia fazer valer, viola o artigo 20.º, n.º 1, da Constituição. Para melhor apreciação desta questão de constitucionalidade, importa, antes de mais, fazer uma breve referência ao regime jurídico infraconstitucional no qual se enquadra a norma desaplicada. A Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, procedeu a uma significativa revisão do Novo Regime do Arrenda- mento Urbano (NRAU), que havia sido aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro. Entre as alterações introduzidas por aquela lei, são de referir as modificações ao regime substantivo da locação e ao regime transitório dos contratos de arrendamento celebrados antes da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, e ainda a criação de um procedimento especial de despejo do local arrendado. O procedimento especial de despejo encontra-se regulado nos artigos 15.º a 15.º-S da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela referida Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, retifi- cada pela Declaração de Retificação n.º 59-A/2012, de 12 de outubro. No seguimento destas alterações, o Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, veio proceder «à instalação e à definição das regras do funciona- mento do Balção Nacional do Arrendamento, adiante designado por BNA, e do procedimento especial de despejo, previstos nos artigos 15.º a 15.º-S da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, retificada pela Declaração de Retificação n.º 59-A/2012, de 12 de outubro» (cfr. artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro). Conforme resulta do seu regime, previsto nos aludidos artigos 15.º a 15.º-S da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro (aditados pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto e cuja redação foi posteriormente alterada pela Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro), bem como das regras de funcionamento do Balcão Nacional de Arrendamento, estabelecidas no Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, o procedimento especial de despejo tem por finalidade a obtenção de um título executivo para despejo do locado e, eventualmente, caso tal seja requerido, para pagamento de rendas, encargos ou despesas. Rui Pinto caracteriza o procedimento especial de despejo como um “processo especial sincrético”, decla- rativo e executivo, através do qual tem lugar a «formação de título suficiente para despejo, seja em caso de não oposição do inquilino ao requerimento, seja por emissão de decisão judicial de despejo, em caso de opo- sição não procedente do inquilino» (cfr. Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, 2013, p. 1160), integrado por diferentes fases processuais, que têm por função a constituição do título executivo, em caso de

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